No Balcão do Quiosque

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

A MELHOR RECEITA




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A minha nhoqueira é assim!




Gosto muito de cozinhar, principalmente quando tenho tempo. Mas é irônico que, na maioria das vezes, a minha comida fique mais gostosa quanto mais improvisada ela for devido a, justamente, falta de tempo! Se tenho tempo demais, eu acabo tentando personalizar um pouco as receitas, e acabo personalizando demais... e não dá certo!


Mas toda vez que faço uma receita, percebo que no fim, para dar certo, é preciso o toque pessoal. Com cuidado, é lógico. Por exemplo: quando se fala em meio quilo de batatas, nem sempre se especifica qual o tipo ou o tamanho das mesmas. Há várias qualidades diferentes de batatas, algumas mais e outras menos aguadas. Talvez, para complementar a receita, seja preciso uma colherinha de farinha de trigo. Se alguém diz "mexer até dar ponto de calda," não se sabe se o cozinheiro está usando uma panela teflon ou de vidro, nas quais é mais difícil identificar se a calda está em ponto de calda... achei sensacional uma receita de calda caramelada que achei na internet, onde o cozinheiro, ao invés de somente dizer "deixar ficar em ponto de calda grossa," colocou uma fotografia com a cor que a calda deveria ter. Deu certinho!


Domingo passado eu fiz nhoque. Tem gente que acha que dá trabalho, mas eu faço num instantinho; é só cozinhar as batatas com sal a gosto (quantas? Depende da quantidade que você quer fazer), colocar uns dois ou três ovos, ir pondo o trigo e mexendo até a massa ficar durinha. Enquanto isso, já está fervendo uma panela de água com um pouco de azeite, sal e algumas folhas de louro. Depois, vou derramando a massa na nhoqueira e após escolher o tamanho que quero as bolinhas, vou apertando o êmbolo e cortando a massa com uma faca de cozinha comum, dentro da água fervendo. Assim que elas começam a boiar, retiro com escumadeira. Faço um molho rápido e fácil, colocando molho pronto à bolonhesa (ponho umas folhinhas picadas de manjericão daqui do quintal), salpico com queijo ralado grosso e ponho no forno até o queijo derreter. É rápido e fácil, e serve como prato único.


 Lembro-me bem da minha primeira tentativa de brigadeiro: era aniversário de meu marido (estávamos casados a apenas um ano) e eu quis fazer uma surpresa; as panelas eram de teflon, e deixei a massa passar do ponto. As bolinhas, ao esfriar, ficaram tão duras, que quicavam na mesa. Mas nos divertimos, comendo as minhas... balas de chocolate!

Acho que a melhor receita para que a minha comida fique boa é: paciência, bom humor, uma boa música de fundo, dois cachorrinhos deitados no chão atrás do cozinheiro, a porta aberta para o canto dos passarinhos, algum tempo livre e a necessidade imprescindível de estar relaxada, tendo a capacidade de rir se não der certo... e muitas vezes, quando não dá certo, acabamos criando uma outra coisa!


sábado, 26 de abril de 2014

MORAR E VIVER




Acho que morar é diferente de viver. Moramos em qualquer lugar. Podemos morar em casas, apartamentos ou até mesmo debaixo de uma ponte. Mas viver é diferente: a gente vive aonde se sente bem, mesmo que seja em um parque, caminhando por uma rua ou por dentro de uma floresta. Viver é estar consciente de tudo o que está em volta, é olhar atentamente, sentir-se bem e agradecer. Conheci pessoas que moravam em casas ou apartamentos lindos, mas não viviam neles.

Acredito que o ideal seja encontrar um lugar onde se possa morar e viver, ao mesmo tempo. Na minha vida, já morei em cinco lugares diferentes, mas só vivi realmente em três. Lembro-me da primeira vez que vi esta casa - não tinha intenção nenhuma de comprá-la e nem sabia que estava à venda. Meu cachorro Aleph, durante um passeio, praticamente arrastou-me para esta rua, e chegando em frente ao portão desta casa, ele sentou-se. Olhei para dentro do jardim, e pensei: "Que lugar bacana! Adoraria morar em um lugar assim..." Antes, havia tido alguns sonhos estranhos com uma senhora idosa de quem eu comprava uma velha casa com uma estufa no quintal dos fundos. Meu marido também sonhara com o carro cheio de materiais de construção dirigindo-se para esta rua (antes mesmo de sabermos da existência da casa).

Bem, comentei com uma vizinha sobre a casa que acabara de ver, e ela me respondeu: "Aquela casa está à venda, e eu conheço a proprietária." Ela fez as apresentações, e fiquei surpresa ao ver que tratava-se de uma senhora idosa, mas diferente da que eu vira em meu sonho - ela era morena, e a do sonho, loira. Mas quando ela passou-nos os documentos para que déssemos início à transferência, vi que na fotografia da identidade, ela estava loira: igualzinho a senhora com quem eu tinha sonhado! Descobri que aqui era o lugar que eu queria não apenas morar, mas também viver...

Não tenho uma estufa no quintal dos fundos, mas tenho um Orquidário para cujas estufas eu tenho uma vista da varanda do andar superior da casa. Coincidência?...



Crônica do meu blog A casa & a Alma





terça-feira, 25 de março de 2014

O sol da praça vazia

Conto nº 3
by Joice K. Worm
  
Com um skate na mão chegou à praça. Havia ali mais alguns conhecidos dele. A cada um que cumprimentava, batia com o punho fechado duas vezes, com as costas da palma da mão mais duas vezes e por fim uma cruzada de dedo mindinho. Era o cumprimento do grupo. Todos deveriam saber a senha para que fossem reconhecidos como um grupo.
Naquela tarde a ida à Praça tinha um propósito. Gostaria de impressionar alguém com a sua arte. Aprendera uns truques e já tinha tido quedas suficientes. Suas cicatrizes não o deixavam mentir. Incluindo aquela que tinha na testa que de qualquer forma lhe dava um certo charme. Para ele, as cicatrizes eram marcas de bravura. Gostava de exibi-las aos colegas de jogo. Quanto mais profundas eram as marcas, mais coragem e resistência comunicavam.
Zim, zim, zim… Assim fazia o som do seu skate enquanto levava um pé em cima e o outro a dar impulso e velocidade. Entrou na pista. Rodopiou e parou no meio da curva de pé. Olhou para seu público à procura de quem iria impressionar desta vez. Aquele velho, talvez. Hum… não me parece interessado. Não por ser velho, mas assim que o viu virou a cara. Ou por desprezo ou por inveja. Não parou para analisar. Limitou-se a isolá-lo dos seus supostos admiradores. Talvez aquele menino que estava a sorver um gelado com o olhar fixo no seu skate. Mas assim que deu a primeira passada, a mãe do menino o chamou e ele obedeceu deixando para trás o espectáculo sem sofrimento. Mais uma parada e mais uma lançada de olhar. Hoje a Praça estava quase vazia. Talvez fosse melhor assim. Ao menos ainda poderia perder algum tempo na sua ‘performance’ e quem sabe tornar-se um profissional e entrar em torneios. Não era propriamente o seu sonho, mas tudo é possível quando se é jovem.
Enquanto pensava em situações de futuro, uma menina da sua idade o olhava com interesse. Por incrível que pareça, não olhava para seu skate, nem nas luvas sem dedos, nem para o seu ténis de marca novo. Olhava para seus olhos. Profundamente. Que desconcertante - Pensou ele.
Não poderia falhar, estava a ponto de dar a partida para uma investida por cima dos degraus que circundava a estátua. Havia lá uma rampa improvisada, mas preferia ir pelo caminho mais difícil. E se falhasse? Não isso não poderia acontecer. A menina era bonita e parecia interessada nele. Será que ela já o tinha visto ali? Ele nunca a tinha visto. Ficou ainda mais interessado em fazer uma boa figura. Olhou seu skate-amigo durante um tempo com as duas mãos descontraídas sobre a cintura e fez uma espécie de reza. Falou com o companheiro de madeira que aquela seria a oportunidade deles para conquistar alguém duplamente. Neste caso, pela capacidade de ambos.
Zim, zim, zim… deu o embalo. Uma ida e vinda de aquecimento, outro rodopio. Uma mirada ao objectivo e um canto de olho para ter certeza que a sua admiradora o estava a olhar. Estava. Perfeito. A sorte será lançada. Àquela distância nada poderia dar errado. Estava tudo rematado. Não havia muitos concorrentes para partilhar aquela que lhe parecia a menina mais bonita do mundo. O sol estava a aquecer suavemente a pele de ambos como se fosse cúmplice daquele segredo. Ele prosseguiu. Ainda com as duas mãos na cintura, deslizou suavemente dando três passos largos de embalo. Zim, zim, zimmmmmm… Agora! Zás!! Um salto de perito!!
Olhou para trás rapidamente para ter certeza que ela viu e constatou satisfeito que não só viu como estava com a mão sobre o coração como se não pudesse aguentar tamanha e perigosa façanha. Isso lhe deixou desconcertado mas ela lhe retribuiu com um sorriso e um gesto simulado de palmas sem som. Foi tudo à distância: O olhar, o sentimento recíproco, o espectáculo, o susto, o agradecimento, o adeus e o até outro dia.
Nada como uma tarde de sol numa praça quase vazia e duas pessoas que se admiram para tornar o dia ainda mais sublime.


Fim.