No Balcão do Quiosque

terça-feira, 28 de julho de 2009

A dura vida de um morto

Morri. E daí?E lá vou eu de novo. A história se repete mais e mais uma vez. Esse negócio de morrer já está ficando cada vez mais cansativo. O fato, é que certos padrões de acontecimentos em vida e em morte, se mantém, como se fosse a mesma partitura de uma música, só mudam os arranjos — ou desarranjos, sei lá. Será que isso não tem um meio de acabar de uma vez por todas? Quando penso nessa repetição de existências espaçadas, concluo que só pode ser reencarnação. Mas como posso ter certeza de uma afirmação dessas se não lembro de minha encarnação anterior? Mas, todas vez que eu morro, quando acho que vou viver o permanente, o eterno... pronto! Um profundo adormecimento me leva a esquecer de tudo o que se passou, e sou levado a morrer também depois que estou morto. Dá pra entender uma coisa dessas? Morro aqui e morro lá?

Observando a confusão que se estabelece em meio a corre-corres, lufa-lufas, comoções exacerbadas, burocracias desgastantes...depois de escolado por tantas idas e vindas, isso não me chateia mais. Que monotonia! A sensação é de que já nasço com a passagem de volta comprada. E ainda tenho que pagar por ela em vida. Nada é de graça mesmo.

Olhando aquele corpo estendido no chão (isso dá samba), inerte, pálido e azulado, não tenho a mínima intenção de tentar ressuscitá-lo. E pra quê? Deixa quieto. Parece uma roupa usada jogada no chão.

Tanta correria, tanta preocupação, e agora aí, duro que nem um boneco de corda (levando-se em conta que de certa forma esse era o meu estado normal quando “vivo”).

E o tal de velório então? Parece que jogaram gás lacrimogêneo no ambiente. Lamúrias, choramingos e choros compulsivos é regra de ordem do protocolo cerimonial. Ou teatral. Se eles soubessem como isso me chateia e perturba...Não sabem que não aconteceu nada? Eu só morri, gente!

Mas também morro de rir quando pego uns flagras de alguém num canto, contando piada, ou outro que não sabendo o que dizer ao parente do falecido aqui, em vez de falar “meus pêsames”, gagueja e solta um “felicidades”. Mas tudo bem, esse é o lado branco do humor negro.

O tal túnel de luz? Ah, de tanto fazer esse trajeto, durmo na viagem. Quando acordo, tô lá em meio à... como é mesmo? Ih, deu branco. Mas até onde me lembro, muita coisa já esqueci. E olha, vou dizer mais uma coisa: esse negócio de inferno e céu não é bem assim não. Está tudo aqui na nossa cabeça. Cabeça? Bem, seja lá onde for, o que eu quero dizer é que nós mesmos construímos, ou esse inferno, ou esse céu. A proporção está diretamente ligada ao grau de importância que damos a isso. E só se descobre isso depois de morto. Isso é que é ser burro, né?

Por isso que eu morro sempre e até hoje não descobri a fórmula certa. É por essas e outras que a gente tem que ser vivo. Não se deixar levar por qualquer tiri ti ti atemporal; como alguém, te metendo medo pelas coisas que você faz ou pelas que não faz. O céu e o inferno, está tudo aqui dentro, ó! Somos nós que construímos. É mais ou menos como construir a casa de seus sonhos: pode ser feliz em um barraco, ou infeliz em uma mansão.

Bem, pra quem já morreu, falei demais. Fui.Tchau, até a próxima...

quinta-feira, 23 de julho de 2009

A última saudade

Um quarto vago, cheiro de abandono por certo o dono, sem desafios, correu mundos sem ir além de algumas quadras. Nada faltou ao homem grotesco, sem parentesco com reflexos e nexos de uma arte qualquer. Lei que deságua, no rosto expressão brava, o mundo deu de ombros ao canto da sereia a um Ulisses, que se tu visses, despercebido seria tamanha abundância de alma vazia.

Feito de sonhos, um homem medonho tem de si um medo tamanho guardado no bolso como um trocado barganha na feira de gente esquecida de dor tão doída sem ter mais o que sentir inventa felicidade no fim da idade pra ser melhor sem tristeza, chega de mentir.Ah! ... minha santa bondade, vem outra idade e eu que já fui, agora só penso na demora do fim que sou dentro de mim. Minha esperteza é destreza talhada por sombras feitas de giz.

Quero partir mas sou-me inteiro inútil e cansado corro pros lados recolho todos meus fardos como gari. A planta saudade me faz ter vontade de ao menos um tempo fugir de teu tempo, voltar à raiz. O ponteiro minuto não é mais arguto; pobre coitado não anda ao lado do último segundo que não mais está por aqui. Estrelas minhas memórias que em mim estão guardadas obnubiladas pelo brilho lembrança sol de meio dia.

Na minha morte será que dou sorte de virar pro lado e dormir como um soldado que o inimigo tombou; piscar meu olho direito depois de ter feito um pedido a quem me aceitou? Indo embora agradeço sem demora ao menos um adeus reconhecendo uma por uma no fim da idade está minha última saudade.

Interação

O Quiosque da Lu, nosso também, sempre tem pasteis bem quentinhos.

Isso em grande parte se dá graças à interação e à coparticipação. O blog já nasceu interativo. Tão jovem ainda, e já anuncia traços de uma personalidade própria, que nada mais é que o somatório das tantas personalidades e estilos individuais. Muito interessante.

Porque aceitei participar, este tornou-se mais um espaço virtual onde escrevo. Aqui chegando, sinto-me em casa, por assim dizer. Leio sempre o que saiu de novo e em geral comento, mesmo quando sob pressão de tempo.

Colegas como a Chica, que tive o prazer de conhecer aqui mesmo, deixam posts essencialmente interativos e que realmente funcionam. Isso me lembra os tempos de estudante, quando à volta de uns chopinhos a gente escrevia páginas de fosse lá o que fosse a várias mãos, literalmente. Não raro alguma parte era lida pel@ própri@ autor(a), por conta de questões como caligrafia. Era muito bacana. Não sei dizer se algo daquilo tudo ficou preservado. Provavelmente não.

Aqui, fica tudo guardado na blogosfera, e teoricamente ao menos tem preservação indefinidamente garantida.

O que tenho a dizer hoje é do carinho que já tenho por este Quiosque, com os quiosqueiros em maior ou menor atividade sempre participando, as sempre interessantes inserções trazendo mais comentaristas, que aparecem a cada nova postagem e em geral se tornam mais lugares virtuais a visitar.

Compartilharemos decerto muitos petiscos ainda, com o recheio por conta do paladar de cada um. Acredito que ainda degustaremos pastel de tudo, com crônicas, minicontos, contos, ensaios, poemas, reflexões, insoliteratura, ecologia, humor, reminiscências, MPB, tudo enfim. Tudo de bom.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Café, telefone e etc (o dia a dia no Quiosque)



Ô de casaaaa! Tem alguém aí?
Tem sim, espera que to indo abrir a porta. Olá, bom dia, meu nome é Chica ...O que deseja?
__ Ah, eu sou Valentina, lá da Editora La Femme. É que a Lu Cavichioli me ligou e pediu que eu viesse até o Quiosque procurar pela Rejane. Você conhece?
Ouve-se uma gostosa gargalhada.
__Rejane? Ah, pois não, ta falando com ela.
Ah, hã... é... ahh.. Bom dia!
_ Mas que modos os meus, nem te convidei a entrar. Venha, acabei de passar um café e tem biscoito de mel que o Luiz Ramos trouxe hoje bem cedinho. Mas você dizia sobre uma tal editora?!
__ Sim, EDITORA LA FEMME... Com licença.
--Claro, fique a vontade.
Logo se ouve passos apressados. Alguém descendo as escadas. É o João neo-quiosqueiro Alves. Passa pela copa rouba um café, dá um bom dia cordial sem estender a mão porque no braço esquerdo carrega uma pilha de livros e na outra leva a xícara com café.
_João? Pergunta Chica- você viu a Lu por aí?
-Pior que não, eu precisava falar com ela. Avisar que a sala dos morangos está mal assombrada. Acho que a Madalena esqueceu algum tipo de magia por lá.
Valentina olhava tudo aquilo com os olhos arregalados.
Dizendo isso, João saiu prometendo voltar no fim da tarde.
Quando Chica retomava sua prosa com a moça toca o telefone:
_Alou... ahhhh ligação internacional. Tapou o bocal do aparelho dizendo: desculpa Valentina, só um instante.
Valentina era jovem, cabelos louros e ondulados que lhe caíam como rendas por sobre os ombros. Seus olhos de jabuticaba reviravam-se já sem paciência. Metida num terninho cor de vinho com risca de giz, arrumava a gola da camisa de seda rosa, pigarreando. Olhava agora para seu pé direito, fazendo certa careta esboçando desconforto. Usava um scarpin no mesmo tom da roupa. Aproveitou que chica estava de costas e por sobre o sapato massageou o dedinho, pensando entrementes: Ai, meu Santo Agostinho, me tira dessa.
Não entendia muito de santos, mas esse foi o primeiro nome que lhe veio à cabeça.
E a conversa rolava solta ao telefone:
Era Joice que voltou pra Espanha em férias. Mas queria saber a quantas andava
sua correspondência .
De repente, ouvimos um FOM FOM! Era a Rosemari com a Rafaella. Elas traziam um embrulho enorme...
O que seria?


Um ponto que vale um conto
Alguém por favor continue daqui.


Beijos da Lu

sexta-feira, 17 de julho de 2009

Ponto de Encontro no Bar com direito a Café


As almofadas estavam espalhadas pelo chão, o salão era amplo, com algumas divisórias.Havia quem gostasse de sentar nas almofadas macias, mas também tinham aqueles que preferiam sentar-se em cadeiras confortáveis, à beira da mesa com cinzeiros e drinks.

Nas paredes, molduras de todos os tamanhos e cores, abrigavam poemas, rimados ou não. Histórias reais ou recheadas de utopias que me faziam sonhar a ponto de incluir-me conhecendo a essência de cada uma.

Nos fundos do bar via-se uma escada que levava ao piso superior, na parede uma seta indicava: Colunas do Empório do Café. O local era frequentado por artistas, poetas e gente que sabe sonhar.

O salão dos versos era cheio de almofadas fofas e coloridas, todas espalhadas pelo chão.

Vez por outra me sentava junto às mesas, tomava um martini, jogava conversa fora, ria muito com o bom humor do pessoal e aprendia com artistas que lá entravam para beber alguma coisa, ler alguns poemas e escutar boa música.

Lá fiz muitos amigos porque na vida o que importa é participar, e acima de tudo viver intensamente.

E como dizem por aí que a noite é uma criança, eu chegava cedo e ficava até altas horas, um bom período para me aproximar dos quadros, que forravam as paredes daquele bar.

E antes que o dia amanhecesse, sentia o aroma inigualável do café coado na hora, que eu sorvia de um gole só. E munido de meus companheiros, chapéu e casaco, eu saía.

Olhava o letreiro apagado, atravessava a rua, seguindo meu caminho.

Por Lu Cavichioli

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Silêncio

O silêncio. Quem o quer? Um par em mudo diálogo? Como se a ausência do som das palavras ou do quase inaudível farfalhar do nada a roçar ouvidos esforçados, solidificasse a certeza do... silêncio.Absoluta solidão? Não, não há silêncio na solidão. O homem só não é silencioso. Ao contrário, nele abunda e fervilha caldos de diálogos inflamados consigo próprio. Só há monólogos onde dois ou mais circundam-se a chacoalhar seus argumentos e interpretações – que Deus tenha piedade de quem os tem – numa acirrada e disfarçada disputa pelo efeito de maior contundência na exposição

Um ente não dialoga; ele “monologa” diante de outros vários e tantos atentos monologantes. Ele apenas dialoga consigo mesmo tentando convencer-se com a precisão de um raro entendimento. Mas vã é a tentativa. Sabendo disso, engana-se a si próprio com a mesma elegância com que interpreta o mesmo engano que para si aprovou, para dar a outrem que o ouve atentamente como se o estivesse entendendo. Um consentido acordo de cavalheiros ocos, a preencherem-se de inócuas tentativas significantes.

Mas, e o sentido? O sentido, contido ficou enquanto internalizado no vasto mundo do imanifesto. A partir da manifestação, deixa de fazer sentido; apenas consente-se para que as delongas não prolongue enfados como em uma sala de espera a espera de se fazer entender.

Diante desse quadro – o qual não decoraria nenhum interior – espatulado com vigorosas pressões na realidade, mostra-se o quanto é praticamente quase impossível a socialização igualitária. Por único motivo: a individualidade. O homus-individualis, nada divide. A sociedade não é composta de “dividuais”. É decomposta por individuais.Nunca será possível a longeva sociedade humana igualitária mas sim a circunscrita e desigual “saciedade” humana.

No silêncio de nossas alcovas individuais planejamos um “mundo melhor”. No máximo “dias melhores” com prazo de validade é o que se consegue. Resta-nos o consolo da engenharia “sensitiva” a construir pontes de acesso ao distante próximo, como uma forma de substituição à individualidade demarcada em nosso DNA.

No ensurdecedor barulho dos monólogos, acenamos com a esperança de que em um dado momento possamos nos fazer entender assim como nos entendemos a nós mesmos antes que interrompidos pela morte, possamos soçobrar em um eco perdido.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Tango em Buenos Aires







Tango em Buenos Aires

( por Rafaella filha de Rosemari)

Nunca saí do Brasil.

Meu irmão tem um fascínio absurdo pela Europa, vive se imaginando andando por ruas Européias e vestindo grossos casacos de lã. Sonha em conhecer outros países e quem sabe até morar em algum lugar bem longe do Brasil.

Eu chego a arrepiar quando as pessoas começam a me retratar um típico dia de inverno em Londres: céu cinzento, noite em plena três horas da tarde, umidade, dias sem ver a cara do meu amigo sol... Não, definitivamente isso não me apetece.

A neve sim me encanta! Mas acho que sou ainda levada por uma imaginação infantil de fazer aqueles bonecos de neve com uma cenoura no lugar do nariz e uma cartola na cabeça. Tenho vontade de sentir as mãos congelando em meio a uma parafernália de casacos, gorros, polainas e um milhão de meias nos pés. Mas é uma vontade de passar uma tarde na neve e depois voltar para casa, algo como ir ao shopping fazer umas compras e voltar, entende?

Devo ter algum problema não é possível, pois dez em cada dez pessoas que eu conheço tem uma sincera vontade de passar uma temporada fora do Brasil, mas eu não!

A verdade é que sou realmente apaixonada pelo Brasil e tenho a idéia de que seria uma traição patriota conhecer os parques Londrinos e não conhecer a Bahia, conhecer pubs franceses e não conhecer a noite carioca... Sabe, é uma questão mais ou menos assim.

Tenho verdadeira vocação para estar em frente ao mar curtindo um bom samba, comendo camarão e contemplando um belo céu azul anil. Conhecer os mares cariocas, baianos e nordestinos me deixa eufórica só de imaginar.

Peguei certa implicância com aquelas conversas de bar onde as pessoas ficam vangloriando-se de suas viagens e falando aqueles endereços na ponta da língua para mostrar que conhecem Londres, por exemplo, tanto quanto a própria cidade natal.

-Onde você morava em Londres?

-Ah, eu morava na rua fulana com a rua cicrana.

- E você?

-Ah, eu morava na rua cicrana esquina com a rua fulana

Putz, eu posso estar errada e devo estar mesmo, mas ta aí uma coisa que me irrita é essa falação de ruas Londrinas, Parisienses, ou seja lá o que for. Aí eu fico quieta só ouvindo com uma baita cara de intelectual, por que nessas horas o melhor que se tem a fazer é isso, ficar muda e calada , pois não vou soltar em uma roda de pessoas alucinadas pela Oxford Street que eu nunca fui e não pretendo ir a lugar algum.

Eu admiro o Zeca Camargo que rodou o mundo duas vezes. O que eu não agüento é aquela história de eu trabalhei de “Au Pair” em Londres, soa mais bonito que sou médica em Londrina, mas na verdade a pessoa trabalhou de babá e vem se gabar prá cima dos outros. Esses dias eu ouvi, trabalhei com louças em Londres, puxa vida, porque a pessoa não fala lavei pratos e pronto?

Absolutamente nada contra as pessoas que vão tentar ganhar a vida em outro país, muito pelo contrário eu fico fascinada com a coragem que muitas pessoas têm em deixar a família, os amigos, sua casa, sua terra para tentar melhorar sua condição financeira. Pois eu admito não ter essa coragem não.

A verdade é que eu nunca me permiti sonhar com Paris.

Nem com qualquer coisa que me soasse estrangeiro.

Como uma criança que já sabe que não pode pedir uma boneca pára os pais no Natal e se conformou com isso.

Como uma adolescente que já sabe que não pode pedir um vestido novo para seus pais e não adianta reclamar.

Não se permite sonhar!

Eu não me permitia sonhar!

O ser humano é incrível na capacidade de enganar a si mesmo. O tempo foi passando e eu pude ir me desvendando, sem medo do que eu pudesse vir a descobrir em mim.

A gente cria uma barreira para o sofrimento altamente fantasiosa. É mais fácil tentar me convencer de que eu não preciso ir ao exterior para nada nem para simplesmente conhecer pessoalmente outra cultura do que ficar passando vontade e ficar sonhando com uma coisa impossível.

Impossível?

Será mesmo impossível?

Não dou dois anos para o meu irmão rodar a Europa.

E confesso MORRER de vontade de dançar um tango em Buenos Aires.

domingo, 12 de julho de 2009

Perfil retificado na Internet




Perfil retificado


Ele nunca gostou muito de trabalho burocrático. Na verdade, ele nunca gostou muito de trabalho pesado. Uma pessoa inteligente, boa aparência, bons conhecimentos, um verdadeiro galã. Assim, ele mesmo sempre se descreveu.

Por que o perfil retificado?

Acompanhem aqui

Luiz Ramos(c)
Foto:ramosforest(c)

terça-feira, 7 de julho de 2009

Entrevista com a verdade. Um conto verdadeiro

Temos a honra de trazer a todos os amantes da verdade, a primeira entrevista realizada ao vivo com esta que é sem sombra de dúvida, o ideal mais buscado e rebuscado pelo mais fidedigno ser humano.

— Boa noite Sra. Verdade, é uma imensa honra pod...

— Me desculpe a interrupção mas, o que o fez se referir a mim com o tratamento no gênero feminino?

— Bem... eu não saberia cumprimentá-la no gênero masculino pois não me soaria usual dizer...boa noite Sr. Verdade.

— Compreendo. Mas devo lhe adiantar que, nenhum dos dois gêneros aplica-se a mim. Estou acima de número, gênero e grau. Por isso sou a Verdade. (aplausos entusiasmados)

He, he, he...nossa platéia está atenta e bastante atuante hoje.

— Mas, diga-nos ... éemmm... Verdade, por quê és tão procurada e dificilmente encontrada?

— Isso não é verdade. Devo dizer que poucos me tem procurado. Por vezes tenho que me abstrair com algum passatempo pra escapar do tédio. E olha que não me escondo não! Esse ser humano é que é preguiçoso. Vive lá aos rapapés com a mentira, que promete uma vida que é só cenário — um cenário tão bem feito, diga-se de passagem, que parece de verdade.

— Mas pelo que se sabe, é histórico, chegando a ser épico, o quanto há eões de tempo, o ser humano a tem procurado... coff, coff (uma tossidela pigarreante); tendo inclusive gerado guerras, derrubado civilizações, criado leis...

— Ahhh, que nada! Esse tal de ser humano só quer saber de ser o que ele não é. Se ele fosse o que deveria ser, seria como eu por exemplo. Sou o que sou: in-con-tes-tá-vel.

— Como você conquistou essa posição inconteste?

— Uma coisa eu posso lhe dizer: não foi através da política. (huuuuuuuuuuu... vaias de uma parte da platéia)

He, he, he...Verdade é engraçada e tem um ótimo senso de humor, não é meus amigos?

— Nem sempre meu caro, nem sempre. Às vezes sou contundente; chegando mesmo a ser trágica. Já desmascarei muita gente com a minha incontestabilidade. Sei por exemplo que você …

Hum, hum...voltamos já, já, após nosso intervalo comercial.

Estamos de volta com a entrevista de hoje. Aqui com a gente, cara a cara: Verdade

— Qual mensagem você poderia deixar para a juventude que está iniciando a busca por Verdade?

— Nenhuma.

— Desculpe...

— Pra que deixar mensagem, orientação, toques, dicas, pra juventude? É tudo mentira mesmo. (OOOHHHH!!!..., exclamou a platéia)

— É isso. Vocês criaram através dos tempos uma atmosfera tão carregada de mentiras, que de geração em geração, quem nasce, vive respirando mentira. Se tirar a mentira, você estará tirando o oxigênio delas. E se eu aparecer e dizer que eu sou a Verdade ninguém acreditará. Pensarão que é mentira.

Interlocutor coça a cabeça, ri amarelado, tosse asmaticamente; se recompõe

— Mas como faríamos para nos libertarmos disso; de toda essa atmosfera envenenada? Dê-nos o conhecimento para atingirmos a purificação e sermos como você, Verdade...(silêncio sepulcral na platéia)

Verdade olha bem de frente para a lente que a enquadra em close. Continua olhando em total silêncio.Sem dizer uma palavra, levanta laconicamente e se dirige em direção à platéia; passa em meio a milhares de espectadores sem que ninguém a perceba; vai em direção à porta de saída do teatro, para e chama um táxi.

— Boa noite Sr. Mentira, pra onde vamos? — Se preocupe apenas em dirigir, ponha o veículo em movimento. Deixe que o caminho, eu indico.
Vruuummmmm...

sábado, 4 de julho de 2009

Dos sofismas e comportamentos neuropsicóticos



Eu perguntei uma vez: "estamos no caminho certo"?
Olhei dos lados, conglomerados de intrínsecas defesas pendiam sobre a mesa. Carrancuda expressão!
Eu logo quis sair correndo- pra onde? Só havia grades!?

As marcas de sangue em meu braço demonstravam que tinha ficado dias na solitária tentando espernear ou morrer, quem sabe?
Todos os raciocínios davam encontrões nas artimanhas feitas de tijolos... “macios” aqueles tijolos.

Eu gargalhava. De súbito punha-me de cócoras aninhando-me da escuridão dos anos.

Casa dos horrores malditos! Apenas um som gutural, sem muito volume em patéticas palavras entravam de fininho pela fechadura. Eu apenas soluçava.

Já nos últimos dias um cadeado subjugava minhas palavras , enquanto membros e sentimentos embotados numa argamassa involuntária de sôfregos suspiros, jaziam num metabólico estupor glacial.

Fatias de neurônios boiavam num coquetel psicotrópico na visão esquálida e suprema da revolta incontida. Eu tecia devagarinho minha viagem intra/utópica/uterina, na louca tentativa de expiar meus pecados tornando-me um ser neo-celular.

Possível passagem/trecho de um esquizofrênico.

Coleção:Boca no trombone

Por Lu Cavichioli

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Um passeio pelas letras ao limite norte de São Paulo

Na avenida que deixa o trânsito da cidade para trás e sobe a serra da Cantareira há de tudo um pouco, como acontece em quase toda parte de São Paulo. A Av. Nova Cantareira principia na região alta de Santana onde é o ápice de toda sua urbanidade e a partir daí é alimentada por várias artérias de asfalto. Por esses caminhos ou “provincias colganderas” (recantos de altos e baixos), assim como dizia meu avô espanhol, acostumado às terras planas da Catalunha, há muitas pessoas que se dirigem para a “cidade” (centro de SP) ou em sua direção oposta almejando a serra. Os que vão para a “cidade”, às vezes param na Av. Voluntários da Pátria, antigo centro de compras da zona norte antes do evento dos shoppings na região, e desistem de ir adiante. Pois naquele bairro movimentado ainda há uma porção de lojas para garimpar variedades, assim como artigos de confecção e alguns objetos de cozinha. No entanto, as boutiques próximas à igreja de Santan’na já não são mais as mesmas. As melhores camisas de seda vermelhas eram vendidas naquela parte. Agora, os camelôs tomam conta das calçadas, enquanto algumas lojas e pequenos shoppings, que mais se parecem a caixinhas abafadas, tentam vender suas roupas a preços populares. Todavia, ainda se acha muita coisa boa por lá, assim como o velho e pequeno shopping Santana e seu sobrevivente cinema do segundo piso, resgatando de alguma forma o charme dos cineminhas de bairro... Mas, eu falava da avenida atrevida, que ousa deixar a zona urbana e indicar o caminho da mata, que é o anel verde de São Paulo, e por isso, agora, deixo a “cidade” e sigo com a tal avenida para a serra.

Atravesso bairros atolados de carros até alcançar a Academia Militar do Barro Branco, em um dos pontos mais altos da avenida, antes de descambar para o vale do Tremembé e subir para a serra. A cena parece um filme de aventuras e agradeço ao destino quando paro no semáforo vermelho neste ponto e posso apreciar o imenso manto verde da serra me esperando, com os raios do crepúsculo cintilando em meus olhos todo aquele “verde cor de tarde” da mata, e o rubor da despedida do sol...

Mas, o que faço eu, indo à serra à noitinha? Não é perigoso, dizem muitos? E eu respondo: os gnomos e guardiões da mata me protegem, porque sabem que eu somente deixo os limites de minha cidade para sentir-lhes a presença. Tenho que diminuir a marcha ainda nas terras de São Paulo, pois quando o carro começa a subir a avenida que aos poucos ganha feições de estradinha estreita e perigosa, tudo muda e a cena urbana se esvai com o cheirinho de mato no ar. Lembro-me de que ali, no “pé da serra” vivia Airton Senna, o senhor das Ferraris vermelhas... Sua casa continua lá... O piloto, apesar de sua experiência ao volante, também sentiria os faróis dos carros lhe cegando na direção oposta e exigindo sua atenção. Se não fosse por isso, eu entraria em um transe hipnótico da natureza, que consegue ser multicolorida mesmo na escuridão, e não conseguiria descrever conscientemente esta cena de despedida urbana, onde a próxima parada é a serrana cidadezinha de Mairiporã e seus charmosos restaurantes encravados na montanha.

Madalena Barranco (Magalena, asim como é conhecida no mundo da fantasia)
http://flordemorango.blogspot.com
A Magalena agradece à querida amiga Lu Cavichioli pela oportunidade de postar neste lindo blog!

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Caim, Caim!

Toca a labuta, filho
dá pouca atenção
ladrar ante a caravana
ah, se vão!
Nem pode dar outra
fazer o que?
Ladrar é coisa de cão!

Ladram que ladram
cadê que mordem
tão miseráveis
que só se ... coçam
de tão mordidos
que estão de pulga
e daí sua burra
malcriação

O papel deles
é esse mesmo
ladram à toa
ladram a esmo
ladram porque afinal
são cães e jamais
de sê-lo eles deixarão