No Balcão do Quiosque

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Eu voto em vocês

Meu voto vai para cada um de vocês. A maioria não conheço fisicamente mas pelas palavras fluem os fluídos da alma. Já dá para "impressionar" a minha percepção dos anseios internos que transcorre pela visão individual; pelo menos a ponta do iceberg, né? Meu voto é pela certeza que existe na busca por valores elevados; entendimento puro, sustentável, mais do que ecologicamente correto, e sim pela leveza do ser; vamos ser crianças quando crescermos e entendermos que viver é a arte de se despedir da infância.

Sintam-se fortemente abraçados; quase "quebrando" as costelas.

Do amigo virtual mas tão real quanto as palavras de afeto que aqui deixo.

Hasta la vista

Leandro Soriano

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

32 de novembro, dia dos mortos.

Chovia torrencialmente no sertão do nordeste. Desacostumados com essa intempérie de sopetão, crianças corriam, adultos viravam crianças e velhos lentamente se deixavam encharcar pela alegria molhada que caiu do céu como uma luva pros 4 reinos da natureza.

Foi assim durante mais de um mês; chuva constante com ligeiras estiagens. Todas as almas sentiram-se lavadas e o peso da sofreguidão ficou menor. Uma esperança nunca antes sentida, agigantou-se como um “terra à vista”. A cor verde, símbolo desse esperançar, timidamente se achegava no rastejo do ex-oceano seco. Tudo que foi, faz parte do passado. Agora só existe futuro de verdade; o hoje flutua como barquinho de papel.
Varanda fresca, silhuetas vivas, acordadas para não perder nenhum momento de raro arrepio.
As estrelas movem-se com elegância como a desfilar em negra passarela; tudo acalanta o gostoso brilho nos olhos de quem sabe que vai amanhecer.
E amanhece. Cheiro de verde no ar palpita o dia. Pássaros grasnam em bandos revoados; uma orquestra de sons invade a cena fértil.

Dia que passa colorido, sem queixumes, só avidez em sorver a bonança generosa.

A noite, no barracão do Jacaré, aprumados na reunião de comunidade, Leôncio apeou na voz de profeta e garganteando falou: “ a gente vamus ter de hora pra frente, uma vida digna de gente abençoada pelo Pai Deus Todo Poderoso; a gente vamu faze pra todos nóis e prus fios de nossos fios, toda coisa boa que nóis vai prantá nessa terra de Deus; chega di dô e dias difírceis; agora a gente vai sê só feliz” .
Uma explosão de palmas eclodiu além do barracão. A criançada misturava com os latidos dos cachorros a balbúrdia consentida.

_Agora nóis vai fazê uma oração pra agradecê toda essa benção.

Silêncio e constrição domina totalmente o ambiente.
“Senhô, a genti agradecemu essa benção molhada de vida
pra nóis prantá nossa felicidade juntu com muié e fios;
toda coisa boa que vem de tu a genti agradece
e as má a genti sabe que é pra nóis aprende a lição que tu
passo pra nóis”

améin meu sinhô

Em meio ao negrume estrelado, saem em respeitoso silêncio a caminho de suas casas cruas.
Na paz do sono cansado, cachorros latem, cabras balem, homens tonteiam; som pesado se aproxima; luzes que não são de estrelas se intensificam.

Som de motores potentes ligados ligam ao um turvo mundo; o medo torna-se atmosférico.
Os homens caminham para fora dos amadeirados em linha aberta a fim de definir o contorno do confuso.
E do difuso surge como apocalipse em forma de chispas atômicas, projéteis traçando o ar cálido
a procura de cumprir a promessa de alvos fáceis. Tão fácil foi que em menos de 15 minutos apenas poucos fracos esganiços de cães diminuíam lentamente.

Uma mensagem via satélite é enviada:

_A gênese metereológica é um sucesso. Já está sendo divulgado o “efeito de epidemia controlada” pela mídia. A incidência pluviométrica aumenta na proporção esperada. Em breve o quadrante 22 estará pronto para ser entregue ao mercado internacional.
São 23h40. O comandante recolhe-se ao container dos oficiais. Banha-se. Antes de deitar lê o salmo 90 e mergulha no sono. Amanhã muito trabalho de desorientação pública deve continuar.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Fim de ano de novo.

É... o Natal tái... e eu nem aí. É um evento que merece uma substanciosa reflexão. Eu gosto... sabe do que eu gosto mesmo nessa época natalina? É curtir as decorações. Principalmente as luzes; muitas luzes acendem lá pra baixo dos porões dos arquétipos do inconsciente, a atração pela luz. Isso me fascina. Sou capaz de andar horas pelas ruas bem decoradas e iluminadas. Mas, como citei no início, tenho minha percepção desse calendário, de uma forma que talvez não agrade a alguns ou muitos dada a sua artificialidade constituida. Fiz até há algum tempo atrás, essa singela poesia onde expiro minhas circunspecções a respeito.
Enjoy and that all folks!


INATO NATAL

O mundo é um Natal que não deu certo
Por isso enfeita-se a realidade
Maquia-se a caridade
Faz-se noite feliz

Árvores secas de vida
Abrigam presentes
Que não são sementes
Apenas piscam...piscam...

E a noite vai passar
Como todas as coisas passam
E voltam os sonhos em trenó
Através dos olhos de uma criança
Que só tem na lembrança
Reminiscência de um mundo melhor

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Deus resiste?

Não. Deus não resiste. Após eônicas pesquisas, reflexões monásticas, posturas yogues, elocubrações xamânicas,debates sócio/político/filosóficos e escaneamentos científicos, chegou-se a retumbante descoberta da não resistência de Deus. Na verdade, somente a verdade, nada mais do que a verdade, quem resiste é o homem. Esse sim é o verdadeiro e único resistente no indecifrável infinito universo. Ele fez-se a si mesmo semelhante a si próprio.

Diante de tanto sofrimento e corrupção um Deus resiste?
O homem, por sua resistência, que são seus atos e tudo que ele cria a sua volta, determina a prova inconteste do resistir — "penso, logo resisto".

Mas os séculos passarão e eu, um passarinho na mão mais do que dois voando, me valerei de máximas e mínimas tais quais “a soma de que tudo sei é que nada sei”.

Não sei quanto tempo resistirei mas uma coisa é certa: assim que eu deixar de resistir será como se Deus nunca resistisse.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Pesos e medidas

O que pesa mais?
1 quilo de felicidade ou 1 quilo de tristeza?
1 quilo de falsidade ou 1 quilo de autenticidade?
1 quilo de amor ou 1 quilo de ódio?
1 quilo de honestidade ou 1 quilo de corrupção?
1 quilo de consciência ou 1 quilo de alienação?
1 quilo...1 quilo...1 quilo...
É só 1 quilo...
E a balança é uma balança porque possui 2 pratos vazios
E duas medidas são sem medidas diante do peso da interpretação
Malhas e cercas de burocracias farpadas afastam e enfastiam
O solar idealizador das quimeras temporais

Sou apenas vestígios de uma sombra que pensa pensar com clareza
É melhor não entender pelo tanto que o entender limita
É melhor saber pelo vasto que o saber liberta

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

São tantas emoções, mais um dia na casa do Quiosque



Boa tarde meu Quiosque, você anda tão esquecidinho, meio abandonado. Tudo por conta das correrias da vida. Mas sabe, estive pensando na correria e me perguntando se vale a pena correr tanto de um lado, de outro, pra cima e pra baixo. Tem horas que vejo tudo passar tão rápido na minha frente que dá até medo. Um medo nem sei de quê, mas que ele mostra sua carranca lá mostra.

A tarde está quente e o sol abraça a Terra cada vez mais forte, sufocando suas entranhas tornando tudo lento, cansativo e nessa morosidade vamos indo e vindo. Hoje eu não parei na contra mão. Estacionei em frente ao jardim do Quiosque e vi as flores acompanhadas de um pássaro e outro. Olhei pras janelas umas fechadas, outras entreabertas. . Ainda bem que a porta da frente estava encostada. Empurrei e vi a nossa Chica contando a história da areia movediça e o melhor, ela estava saboreando um pedaço do meu bolo de aniversário que deixei no Retratos.

Ia cantarolando enquanto dava uma geral em sua sala onde as sementinhas pululam nas cores da vida.
Passei por ela, lhe dei um beijo e subi a escada caracol um tanto cabisbaixa. Parei lá no alto, olhei as salas, todas vazias, algumas escuras e tristes.

A sala Madrepérola ostentava sua porta nacarada . Toquei na maçaneta de pérola e vi que estava trancada. Em seguida algo me chamou a atenção: havia um bilhete avisando que ela estaria aqui à noite. Que bom, assim ela me ajudaria com o tal de Indriso, nosso neo amigo poético. Nesse m omento toca meu celular, era ela: Dona Graça Lacerda. Mas que coincidência?!

Depois de um papinho breve continuo minha ronda e entro na sala enigmática .Sua escrivaninha está cheia de papéis empilhados sobre uma pasta alaranjada. Ao lado vemos uma luminária em forma de sol. Na cadeira uma jaqueta, esquecida e adormecida, um óculos escuro na mesa de canto faz companhia ao abajur. Será que o Leandro passou aqui hoje?

Na próxima saleta acendo a luz e me deparo com duas poltronas forradas de cetim floral e uma estante em patena acastanhada que abriga de Foucalt até Clarice Lispector. O vaso de flores ainda exibe a beleza incomparável das rosas vermelhas que gritam por um pouco de luz. Então abro a persiana, olho na parede e vejo o sorriso iluminado da Rose no painel que a Graça fez para o blog Rosa. Passo a mão pelas rosas, esboço um sorriso no canto da boca e saio tranqüila.

Agora eu caminho até o final do corredor, onde temos ainda 3 salas. Vou aproximando-me da porta camarão com vidro fosco entremeada por uma pintura lilás na madeira brilhante. Abro e me deparo com um tapete entre o céu e o mar no azul de suas nuances. O aroma do incenso ainda perdura e, neste momento, parece que ouço flautas ou pífaros em cada canto da sala.
É uma sala feminina, feita de laços e rendas. Na mesa, um livro escrito pela dona Fantasia e sua discípula: Madalena Barranco.

Mais na frente restam duas portas que estão abertas e nelas vejo luz. Será que tem alguém trabalhando? Apresso o passo e encontro O João que deu aquela passadinha básica deixando no ar seu toque de mestre na linguagem de todos nós. Passo por ele aceno com e ele sempre gentil, responde continuando seu trabalho. Deveria estar preparando sua aula.

Vou então em direção à outra sala neste final de corredor.
No carpete a luz permanece na amplitude do verão que se aproxima na réstia de sol que escorre pelo vitral que emoldura o corredor. Já avisto o sofá amarelo, os quadros de Picasso na parede, as fotos dela e do marido. Entro na sala e contemplo o arquivo dos sonhos e dos pequenos milagres que todos os dias ela pratica em sua profissão, além da escrita que também cultiva nas horas vagas.

A sala tem o cheiro do Brasil com as paredes em azul texturizado , e o teto rebaixado em gesso sorria com focos de luz anil. Na parede central um berimbau fez-me sentir em férias com um côco gelado à minha frente. Na estante, livros e cadernos enfileirados. Na mesa de canto, um porta- retrato com a foto das filhas.
Um jarro de flores no canto esquerdo que abraça junto à parede um pôster de Barcelona. Sinto saudade. Que pena, a Joice não está.

Saio e vou em direção a uma pequena escada metalizada de um fosco esverdeado que dá acesso ao segundo andar. A sala Degradê está aberta e já ouço o canto da minha calopsita.

Antes de entrar, em frente à minha sala há duas portas, trancadas. Uma é pintada de um verde fosco com maçaneta na cor champanhe e na entrada um tapete bege com motivos da natureza. Na porta há uma tabuleta em madeira trabalhada a mão com um emblema do Cristo Redentor e logo abaixo a inscrição: RAMOSFOREST. Luiz Ramos também não está.

E ao lado vejo uma obra de arte. Porta e parede formam um painel de fotos , algumas estampadas na própria pintura e outras pregadas no mural de cortiça. Coisas de Marcos Santos.
No batente superior uma inscrição : FOTO & GRAFIA





Dou meia volta, entro na sala Degradê, fecho a porta apostando mais um dia na amizade , esse sentimento que une as pessoas.
By Lu C.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Crime contra o meio ambiente! S.O.S à Sociedade Protetora de Animais




Quiosque cheio, fim de tarde, quase verão e coisas anormais acontecendo nesse país.
Me poupe!

Gente, estou perplexa!
Acabei de ver uma notícia pra lá de absurda. Embusteiros, sem vergonhas, canalhas, e(é melhor eu parar por aqui)... Imaginem que no centro de S. Paulo, há mais ou menos 3 anos, um casal de safados, matava cachorros e vendia a carne para restaurantes da região. Dizia a notícia que os fregueses mais constantes eram os coreanos. Que compravam a carne e servia como se nada fosse. MEUS SAIS!!!!! Onde estamos?

Sorte a nossa que policiais acharam o abatedouro dos pobres cachorros (que monstruosidade), e prenderam os desgraçados que faziam isso. Conseguiram salvar um rotwailer que estava acorrentado e um olhar mais triste que já vi.

Agora, informaram que irão confrontar os fornecedores e os usuários. E, OXALÁ, todos esses vagabundos apodreçam no xadrez. Pena que nesse país o crime compensa.

Estou muito revoltada com essa notícia. Dá vontade de cortar as mãos desses assassinos. E esses coreanos que vão pro raio que lhos parta.

Desculpem o desabafo.

Lu Cavichioli

Vernissage

Estava ali sentindo-me quase sufocado. Meu olhar borrado envidraçado não conhecia fixação de foco. Valia-me do surreal para conectar-me à realidade permeável pelo improvável. O que mais me atormentava eram as ondas de consciência de boa resolução, que como maré, escamoteavam no seu vai e vem as claras respostas para tudo em meio ao lixo despejado pelo turismo mental. “Como pude chegar a esse ponto?” — repensava continuamente... na mente contínua... e continua contínua mente... Meu equilíbrio advinha sabe de onde? De bocejos que estremeciam minhas estranhas entranhas devolvendo-me re-articulação perceptiva. Uma dádiva, poderiam dizer alguns introspectivos ignorantes com suas análises de fôlego curto. Que sabem eles da luminosidade turva? Da conservante oleosidade sutil? Pra lá de enfadada estava minha aquosa inteligência, tão plena, tão segura de traçar linhas tão eqüidistantes sem sair do lugar... lugar comum... comum... comunguei... excomunguei... Mais um bocejo e arremesso-me do desespero ao re-equilíbrio. Mais uma vez. Quanto tempo irei suportar esse tampão existencial? Que absurdo! ... não há voz interna! Quando isso observo torno-me servo... do quê? Pra quê? Não... outro bocejo não!

Quero dormir. Ordeno-me: Durma! Meus olhos não se fecham. Olha só... não tenho olhos! Só agora pude ver isso de tão perto que estou de algum desfecho. Fecho as mãos e liquidificam-se. Mexo-me e borbulho-me. Não há solução. Já sou solução. Uma combinação de elementos mentais que somente tornar-se-ão “coisas”, figuras, objetos, paisagens, oceanos, montanhas, céus, homens, crianças, lagartixas... lagartixas... bocejos... ensejos... que seja.

Espere... espere... algo retira-me. Gira-me... girou-me! Destampei-me! Respinguei-me de alegria! Afinal, a vida trouxe à existência o papel como suporte para minha manifestação. É festa! Vim ao mundo! Fiz-me luz e sombras, proporção e perspectiva.
Meu sangue nankin agora toma corpo à vontade sob a pena de Marta, umedecida.
Minha fome procura um ponto de fuga. Encontrei-me no início de um esboço de alguma obra! Minha existência não é vã. Meu traçado aponta infinitos inflamados pelo furor do escape ao limite imposto pela moldura tão bela quanto inocente. Fazem me crer que sou apenas um quadro na sala. Nada mais do que isso.

Alguém gosta?

Alguém gosta de poesia? Eu gosto. E tento fazer algumas. Talvez o que escrevo possa passar perto do que se poderia chamar de poético. Mas, me faz bem quando escrevo. Pelo menos isso... rs



Como um remo que parte

Como um remo que parte
E deixa o barco à deriva
Assim foi tua partida

Nem mesmo era crepúsculo
Nem mesmo era esperança
Desde cedo já tardia

Uma dor quase sentida
Me fez esquecer das alegrias
Me fez lembrar de um só dia

Amanhã eu já estarei Rei
Ordenarei aos meus súditos sentimentos
Limpa o salão do coração
Prepara-o para um novo evento

Não há de ser tudo
Nesta vida água corrente
Deixo-me esbarrar na liberdade
Sou toco de enchente

Agora que estou só
Só morrerei para os olhos que não me vêem
Nem a tristeza com toda sua elegância
Fará sombra sob o sol de minha derradeira paisagem



Leandro Soriano

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Aventuras do Quiosque (by Lu C.)



Eu costumo escrever e brincar com meus colaboradores e amigos aqui no Quiosque. E de vez em quando escrevo algumas aventuras que "vivemos" dentro da maravilhosa máquina de sonhar: NOSSO PENSAMENTO.

Eis mais uma histórinha divertida do dia a dia no Quiosque do Pastel.


Ontem passei rapidamente pelo Quiosque a pedido da Chica e da Graça , pois elas tiveram a idéia de aumentar o jardim e trouxeram mudas de todo tipo para florir nossa casa. Como estava com pressa nem tive tempo de ir à sala dos dicionários dar um abraço no João.

Enquanto o Empório do Café fervilhava de hai-kais , somados aos disse daqui/ disse dali, a Rose dividia-se entre a saleta rosa e seu consultório.
Madalena, tentava agrupar seus duendes que sem controle, corriam ao redor da Bruxauva que andava às voltas com seu novo feitiço.

Leandro Soriano, no balcão, tentava localizar o Marcos e o Luiz, que estavam no Recreio dos Bandeirantes em uma palestra sobre meio ambiente.
De repente toca meu celular, era a Joice avisando que a remessa de livros para os cursos em espanhol deveriam chegar na semana que vem. Ufa, que alívio.

Depois dessa parafernália toda, subi correndo a escada em caracol que termina na sala Degradê, pois precisava preparar a postagem sobre o Mural do Escritor. Mas para minha surpresa e terror, olho pela janela e vejo um burburinho em frente ao Quiosque.

MEUS SAIS!!!! Um carro da CET –
Multa?!
Ahhhh , parei na contra mão.

SOCORRO, CADÊ TODO MUNDO?

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Trecho Primeiro da breve história de vida de G. Apolinário





La Femme Blue – A Definição (releitura da Obra de Roberto Drummond: A Morte de D.J. em Paris)
A mulher que usava sapatos musicais e era azul

(Trecho de um diário alucinante escrito supostamente em Paris)

Quando ele me ligou de madrugada eu ainda fumava a última “bituca” que tinha achado no cinzeiro naquele dia fatídico.

O luminoso alaranjado atormentava a penumbra sonolenta daquele quarto pegajoso na periferia de Paris.

A voz dele tremia de tal forma, que fazia vibrar a calada de uma noite sem fim. Procurando meu chinelo, decidi ir até o banheiro e dizer olá para minhas olheiras e responder a ele que não acreditava naquela conversa absurda, e perguntando a meus neurônios o que estava fazendo em Paris, atrás de um amigo maluco que jurava amar uma mulher azul (...)

A definição pode parecer incrivelmente ilógica, mas no decorrer das páginas deste diário ( que tive a ousadia de roubar), as situações e "loucuras" poderão até ser explicadas.

(By Lu Cavichioli)

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Projeto que deu certo!


Amigos queridos!
Estou lá, nos meus Botões de Madrepérola, apontando uma pequena sugestão em forma de um Projeto Educacional, para finalmente ver se meu grito manso consiga produzir eco em meio a autoridades e poderosos líderes de nosso país, ou até mesmo junto a pessoas comuns, de todas as classes, de todas as raças, credos, cores e etnias, pessoas de bem e virtuosas, com sugestões e práticas tão simples que forçoso se torna admitir que é uma vergonha essas mesmas 'práticas' terem sido abolidas de nosso cotidiano!!!
Palavras gentis...
Amor nas atitudes...
São presentes que Deus nos outorgou por termos sido feitos à imagem e semelhança d'Ele, e não tínhamos o direito de sequer ter chegado a um ponto próximo a tudo isso!
Descaso com as palavras, palavreado desenfreadamente 'chulo', gírias as mais gritantes possíveis...internetês... meu Deus!
Voltemos ao que era bom!
E graças a esse mesmo Deus, em quem coloco todas as minhas esperanças, mas sem esperar tudo d'Ele, é que esse meu grito suave já está felizmente encontrando ressonância!!!
Já entenderam minha proposta: uma psicóloga, dois jornalistas, um deputado, professores, e demais pessoas e amigos das mais diversas áreas.
Apelo também aos que têm alma de poeta (como eu), de vida e de efeito, que compreendam que a POESIA já está intrinsecamente engajada nesse Projeto, pois não é poesia toda palavra gentil, harmoniosa e bela que sai de dentro do nosso amável coração???
Grande beijo!
Visitem botoesmadreperola.blogspot.com

domingo, 25 de outubro de 2009

As horas

O dia amanhece como se eu estivesse empurrando um trem. Não foi fácil me levantar. As horas pesavam e o ombro de minha consciência, dolorida, carregou mais um peso do mundo. Faltava-me algo mas não sabia o quê exatamente. Um esforço hercúleo foi o que tive que fazer para lavar o rosto. Tinha que me olhar no espelho. Vagarosamente levantei o rosto para encarar-me. Rosto? Onde está meu rosto? NÃO TENHO ROSTO!!! Um pavor indescritível dominou o que, creio, ser eu mesmo. Levei instintivamente minhas mãos ao... seria rosto? Inútil esforço. Minhas mãos só existiam quando olhava para elas. Se tentasse tocar meu rosto sumido, elas também sumiam. Pensei: “estou morto?” Não, não estava morto. Sentia minha respiração e ouvia o arfar de meus pulmões. Ainda em meio a confusão mental, toquei levemente em meu coração. Lá estava ele em rápidas batidas como querendo dizer: “aqui estou eu, vivo, ao seu lado”. Não estava só. Tinha a companhia de meu coração, meus pulmões, minhas mãos e minha mente confusa. Minha mente? Posso pensar, pensei. Vou falar em voz alta o que estiver pensando. E soltei: “ONDE ESTÁ MEU ROSTO!?”. Ouvia nitidamente minhas próprias palavras.

Já sei. Vou sair às ruas e observar a reação das pessoas. Claro. Se tudo isso for real saberei imediatamente. Assim fiz. Peguei meu casaco, vesti meu jeans, calcei meu tênis branco sujo e fui para rua.

As pessoas passavam por mim e não me olhavam. Ninguém me olhava. Um casal de idosos taciturnos que caminhavam sem trocar uma palavra entre si, passaram por mim como se passassem por uma estátua desinteressante. Estava a ponto de gesticular propositalmente para chamar atenção ao primeiro que passasse.

Lá vinha um adolescente. Aquele jeitão desligado, desencanado me estimulou a um gestual qualquer que chamasse sua atenção.

— E aí brother, sabe onde posso... Nem terminei a frase e o garoto passou por mim como se eu fosse invisível. Invisível?

Foi então que percebi que eu apenas percebia. Eu era um “percebedor!” Existe isso? Não sei explicar mas eu falava e não havia voz; eu me movia mas não haviam membros que me conduzissem; eu pensava e via o que eu pensava... Sentia-me totalmente perdido diante dessa situação. Poderia correr, saltar, gritar, imaginar... e tudo isso não bastaria para me dar uma forma definida. Eu era e ao mesmo tempo não tinha como provar isso aos outros.

Cabisbaixo caminhei até o parque. Sentei-me, ou achei que estava me sentando, no primeiro banco vazio que encontrei. Diante de mim a visão de um lago salpicado de miríades de pontilhos resplandecentes. Isso me reconfortou. Entrei espontaneamente em um relaxamento sem corpo ou algo assim. A brisa massageava o que poderia ser meu rosto. O devaneio era inevitável.

— Você irá se acostumar. O tempo lhe será indiferente.

Disse-me uma voz quase que sussurrando em meus ouvidos. Se é que eu os tivesse.

— Quem é? — perguntei.
— Sou uma voz assim como você.

Devo estar ficando louco, pensei ou, disse isso a mim mesmo. Mantive-me surpreendentemente calmo. O suficiente para encarar a voz amorfa.

— De onde você é?
— Sou daqui, desse mesmo instante que o seu.
— Você é apenas uma voz?
— Sou se isso lhe deixa à vontade.
— Você sabe me dizer por que há apenas vozes e não formas ?
— Porque a realidade é feita somente de vozes. O mais são apenas formas dissimuladas.
— O que está acontecendo comigo?
— Nada de importante, que eu saiba.
— Como isso pode não ser importante?
— Calma, calma... se acalme
— Ok. Me diga o que acontece então com as vozes?
— Como assim?
— Ela duram para sempre ou isso em dado momento se acaba?
— Claro que se acaba. Ou você acha que uma voz se manifesta indefinidamente? Um dia todo esse vozerio silenciará por completo.
— E o que vem a seguir?
— O silêncio.
— Então é o fim?
— Não. É o silêncio.
— Qual a diferença entre o silêncio e o fim?
— O silêncio não se acaba. O fim, sim.
— Qual a utilidade da voz então?
— Só existe uma utilidade: entender o silêncio.
— E o que há de tão importante no silêncio?
— Nele, cessam-se todas as perguntas.
— Mas sem perguntas como poderei chegar à compreensão das coisas?
— As perguntas servem apenas para se chegar a conclusão que não se compreende as coisas.
— Isso não tem fim?
— Sim, tem.
— Onde se encontra então a compreensão das coisas?
— No silêncio.

domingo, 18 de outubro de 2009

O caso da coisa

Vou contar uma coisa pra vocês. Existe algo mais intrigante, mais inquietante, arrebatador do que descobrir o que é realmente uma coisa? Não, não... certamente que não. Pois uma coisa nunca é explicável por completo porque se assim fosse nunca seria uma coisa e sim algo. E uma coisa que venha a ser algo vai contra o estatuto do indefinível: uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa. Dessa forma entendemos o quanto é importante manter o estado de coisas de forma inalterado. Isso facilita o controle amplo e irrestrito de todos aqueles que estão com suas atenções totalmente voltados para as coisas. Esse é o lema para quem tem o leme nas mãos.

A coisa possui um valor universal. Pode ser utilizada como ponte de acesso ao entendimento para qualquer coisa que exista e até mesmo para as que não existem. Por exemplo: sabemos que alguma coisa criou tudo que está manifestado. E o que é essa coisa? Essa coisa ninguém sabe. A coisa é absoluta. Não depende de ninguém ou de qualquer outra coisa. Conclusivamente tudo vai dar na mesma coisa.

Se alguém tiver alguma coisa a acrescentar fique à vontade. Pois uma coisa nunca é a mesma sempre. Ela transforma-se em outra coisa muitas vezes antes da próxima piscada de olho. Daqui para frente passe a olhar para as coisas como quem olha para a permanência da própria vida. Faça a coisa certa antes que as coisas nunca mais sejam as mesmas.

Ah! Só mais uma coisinha: ... eu ia dizer mais uma coisa mas esqueci. Não tem importância fica pra próxima.

sábado, 17 de outubro de 2009

Palavras são palavras, ...

Nas palavras de uma língua, está encerrado muito da alma de um povo ao menos, o que fala esta língua.

Línguas há que são faladas por mais de um povo (como o inglês, o espanhol, o nosso português e algumas outras), bem como povos há que são falantes de mais que uma língua (como os canadenses, os suíços e alguns outros).

Cada língua tem, por assim dizer, suas "células" ou unidades constitutivas, a que costumamos chamar palavras.

Definir - ou mesmo simplesmente identificar - uma palavra nunca é tão fácil quanto talvez pareça.

Se quiser verificar, escolha um texto qualquer, escrito em num idioma que lhe seja absolutamente ininteligível. Tente agora contar o que ache serem suas palavras. Você contará naturalmente unidades gráficas limitadas por espaços, como fazem os editores de texto eletrônicos. Você terá feito uma contagem de espaços, mas não de palavras.

Só para ilustrar, digamos que a língua cem por cento ininteligível pra você é o alemão. Também serviria árabe, chinês, hindi, opção é o que não falta, pois todos nós sempre ignoramos a maioria das divinamene confundidas línguas existentes.

Em alemão, então, você contará como duas palavras cada verbo "trennenbar" quando este estiver com seu prefixo destacado. Isto porque a parte de base de tais verbos alemães aparece antes (às vezes bem antes) de seu prefixo separável, que vai lá para o final da sentença, antes do ponto ou seu equivalente. Tal estranheza vocabular afeta, para piorar as coisas, a maioria dos verbos alemães.

Assim, um verbo como "vorstellen" pode (e costuma) aparecer como "stellen (não sei o que lá) vor". O verbo "aufmachen" como "machen (não sei o que lá) auf". Esse "não sei o que lá" pode (e costuma) ser bem longo, também.

Por outro lado, compostos por vezes longos se formam muito frequentemente em alemão. Com um só desses "palavrões" teutônicos dá pra se dizer algo do tipo "a maçaneta da gaveta da mesa do gabinete do ministro de estado das relações exteriores", ou alguma outra esquisitice congênere, que naturalmente seria contado como uma palavra só. Mas é mesmo?

A contagem feita apenas pelas unidades demarcadas por espaços acabaria por refletir um número completamente falso, e bem distante do número real de palavras.

Existem coisa de seis mil línguas no mundo, e a esmagadora maioria delas são línguas ágrafas, ou línguas em que nenhum sistema de escrita existe. Quando se trata de identificar o que é e o que não é uma palavra numa língua dessas, vemos que a coisa realmente está longe de ser tão simples como nos parecia.

Vemos nos dicionários aquelas unidades lexicográficas chamadas verbetes ou entradas. Elas normalmente tratam de palavras isoladas, que ali vão definidas, explicadas e exemplificadas como tal. Isso nos dá a impressão falsa mas muito reforçada de que palavras isoladas são coisa que existe. Mas na verdade assim não é. As palavras só existem em associação umas com as outras, de acordo com muitas e bem complexas regras.

Mesmo quando utilizamos uma palavra só, há um bom número de outras a ela indissociavelmente ligadas naquele determinado contexto, que simplesmente ficam subentendidas.

Se dizemos só "fogo!" por convenção ou por medida de economia, sempre queremos dizer algo do tipo "comece a abrir fogo agora", ou então "faça logo alguma coisa para ajudar, que temos aqui um início de incêndio!"

As palavras encerram em si mesmas um enmorme tesouro, por vezes bem pouco explorado.

Se averiguarmos a formação, a origem, as colocações fraseológicas, a evolução histórica e tantos etcéteras cabíveis, veremos facilmente como são ricas as palavras, e que interessantes coisas há por se descobrir nelas e sobre elas.

Estou definitivamente convencido de que se a elas nós dedicamos suficiente atenção, elas sempre retibuem lindamente.

As palavras, essa coisa tão vaga, tão relativa, tão imponderável, de certa forma nos enriquecem com uma grande fortuna, embora nem sempre traduzível na "outra", a tal fortuna atrás da qual tantos passam a vida a correr.

Mas pelo menos esta fortuna intangível não se desvaloriza nunca, pode-se repassá-la em vida e sem qualquer perda patrimonial, não se perde e não há quem nos possa tomar.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Ontem eu resolvi cuidar das flores




Depois de tomar meu rico e saboroso café da manhã em agradável companhia no Empório, com a nossa estimada Lu Cavichioli, a escritora convidada especial Herta Müller, a brasileira não menos importante Lya Luft, a Rose, o 007 BOND, eu só podia mesmo era depois de toda essa atmosfera literária no Mural do Leitor, dançar e cantar. E ficar muito feliz. Decidi, então, que tinha muito o que fazer...
Coloquei uma música alegre para ouvir, e avistei: lá estavam elas, as minhas violetas, cada uma em seu vaso original. Não quero mais assim, pensei. Vou fazer um belo arranjo improvisado para mimoseá-las.
Minha cozinha ganhou um novo visual, depois que ficaram, todas juntas, em uma nova floreira retangular de tupperware sem uso. Há tempo que eu só guardei porque intuí que algum dia poderia servir, e serviu lindamente, pois tem um desenho fazendo um composé que valorizou ainda mais minha cozinha e as violetas azuis,lilases, rosas, de várias cores !
Tenho também dois coqueiros plantados em vasos tipo V e fui depressa olhá-los... minha nossa, como estão crescidos! Crescidos e descuidados, e lá fui eu à luta, arregaçando as mangas, e nesse momento quem me viu jurou que eu parecia mais um bombeiro apagando chamas, soldado empunhando armas, furacão, tsunami2, tudo aquilo que só o vento conseguia acompanhar...
Mas foi um chacoalhão e tanto! Eu havia descurado minha vida exterior, devido à dedicação total aos meus xodós internos, em detrimento de coisas que também precisam de atenção e cuidados!...
Amei esse despertar para o aqui e o agora. Saí também, fui dar uma volta pelas ruas do meu bairro e pela cidade: nossa como está tudo diferente! Foram elas que mudaram ou fui eu que mudei?...
Comprei roupitas novas e cuidei também de moi!
Finalmente, instalou-se um bem-estar geral em meu dia, que se prolongou por toda a tarde e noite a dentro. Já estava preparando meu chá de camomila para coroar este dia, quando...
De repente... buemba!!!
O Quiosque! Meu Deus, o Quiosque. Eu adotei esse filho há algum tempo, e assim como se faz na vida real, nós queremos burilar, corrigir, enfeitar, e com isso, erramos, contornamos, corrigimos, para vê-los enfim caminhar novamente, seguros e felizes.
Surpresa...
Eu não havia decidido ontem cuidar das ‘minhas flores’?
Cuidei.

postagem feita por Graça Lacerda

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Demolição Implacável (crônica em memória de meus avós)



"Ao entrar na casa, onde tantas recordações me fizeram chorar lágrimas ocultas, pude ver através
das paredes, pessoas queridas. Seus rostos sorriam no retrato dos tijolos que estavam agora recobertos
por uma fina camada de argamassa em tom pastel.

Meus pés tocavam aquele piso recém colocado que teimava em ser bonito, rindo-se do assoalho antigo e cansado.
Cômodos ainda vazios , teciam a fina renda de uma saudade.
Eu, estática na porta do quarto , enquanto luzes brincavam em minha íris, revelando uma antiga cama, que vestia sua melhor colcha.

Cortinas abraçadas às janelas aparavam uma réstia de sol que insistia em atravessar a veneziana.
Na sala, a mesa de jantar namorava a cristaleira espelhada que ouvia vozes e risos dos encontros familiares.
Encontros que já dormem o sono da eternidade.

No jardim, o canteiro sepultado entre imponentes lajotas, que ainda não tinham nenhuma história pra contar.
O terreno vestia roupa nova.

No quintal, cacos de cerâmica empilhados, comentavam sobre a nova proprietária. Uma piscina imponente e atrevida que insistia em rir, , olhando para mim, trazendo na expressão fria e azul, um não sei quê de abstração: _ "Nem te ligo!

Coleção: self – by Lu Cavichioli

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Oito filhos - um falecido!



Um enredo, uma odisséia, um folguedo ou apenas uma mania?

Sinceramente não sei mais o que fazer com essa mania de criar blogs. Tenho sete blogs e um falecido (que loucura)... E perguntem se dou conta – claro que não né?
Olha só, tudo começou com o filho mais velho – ESCRITOS NA MEMÓRIA. Que atualmente fechei pra balanço. Mas, balanço de quê vocês devem perguntar... rsrsrs .Acho que um balanço das idéias , das blogadas e imagens. Repensar layout e outros bichos.

Em seguida, engravidei do RETRATOS EM DEGRADÊ, que frutificou a partir do título de um de meus poemas. Curioso isso né? Meu segundo filho, o blog da vez. Ele é bem freqüentado, hospeda muitos leitores , amigos, simpatizantes e alguns dissidentes (que eu sei!) rssssssss, mas mesmo assim, a paisagem do meu retrato continua firme e forte. ROSA CHOQUE – NÃO PROVOQUE!

Depois eu inventei um blog de estética que eu nem lembro o nome porque logo acabei com ele. Mas a idéia continuou fluindo nessa louca e desvairada cabecinha blogueira. Atualmente, esse filhote saiu da casca e desfila em figurino azul claro e flores no olhar. Seu nome é sensibilidade: PELE E FLOR.

Mas vejam só, após o rosa choque que é degradê eu dei a luz ao terceiro filho, o LA FEMME, um blog ousado na cor despojada do azul no preto. Lindíssimo e escultural. Lotei o blog de imagens azuis e tal. A idéia desse blog era escrever a releitura da obra de Roberto Drummond, um escritor renomado desde os anos 70 e que ganhou o Prêmio Jabuti de Literatura pela obra que eu estava disposta a reescrever sob minha ótica. Comecei então (toda animada) a escrever a série: UM SONHO EM PARIS - que alguns amigos já leram e acompanharam. Mas que decepção! O LA FEMME não deslanchou coitadinho e morreu na maternidade, posto que ainda era um recém-nascido. Com muito pesar eu enterrei toda aquela beleza azul e preta. ( O Falecido).

E lá ficava eu atormentada com uma somatória de idéias pra lá e pra cá, até que resolvi abrir o Lu na Cozinha – meu blog culinário, o filho número quatro(que está vivo mas encarcerado). Uma verdadeira loucura ele, sabem? Travesso e endiabrado, dando um trabalho danado pra atualizar. Mas como eu tinha muita paciência com ele, ficou algum tempo no ar e cresceu, fez amigos contava muitas histórias de guloseimas, dicas pra festas e reuniões informais. Arranjo de mesa. Danadinho ele! Até comidinhas pra chá de bebê ele inventou. Mas aos poucos a geladeira foi ficando vazia, a despensa triste olhava o pouco mantimento já quase com data de validade vencida. A conta de gás atrasada, e já com a mesa toda desarrumada e a toalha cheia de migalhas... A Lu fechou a cozinha.
BUaaaaaaaaaaaaa!!!!!!!!!!


Mas não pensem que a produção parou por aí. Outra gestação, filho de número 5.
Voltando eu de uma viagem do litoral norte de São Paulo, olhando a paisagem ainda beira-mar, li uma tabuleta que dizia: QUIOSQUE DO PASTEL. Pronto, na mesma hora veio a idéia: AHHHH VOU CRIAR UM BLOG COM ESSE NOME.

Revirando os olhos eu me perguntava: “mas o que vou fazer neste blog? Não tive resposta imediata não, foi como fazer uma peça de cerâmica. Onde se senta com a coluna encaixada, estufando o peito, afastando os joelhos e a argila deslizando entre os dedos e fui assim. Comecei a moldar uma idéia: a de tornar um blog comunitário.E veio vindo aquele mundaréu de idéias e pessoas. E fui botando tudo logo no papel para não perder uma só letrinha.
Gestação feliz, parto um pouco difícil, mas com ilustres visitas e uma turma de arromba.

Nasceu então meu rebento com idéias avançadas por ser ainda tão jovem. Ele queria muita gente à sua volta, pois ali seria aberta uma casa de crônicas com pastel e o que mais viesse. E assim foi. Meu Quiosque enviou convites para um grupo alegre, inteligente, criativo e acima de tudo companheiro.
Hoje, meu grupo de quiosqueiros manda ver e arrebenta na escrita.

E assim tudo ia caminhando bem até que meu fascínio libertou outro rebento: o L’AMOUR, um filhote afrancesado chique e cheio de plumas e paetês. Glamoroso que só. Por ser quase o caçula anda meio mimado e só quer colo. Fica dormindo a maior parte do tempo. Mas deixa, que logo mais (tomara), ele acorde e comece a andar e produzir noites francesas, visitas a museus e lojas e um pouco da história de Paris.

Mas a doidivanas que vos fala pariu mais um filho, o caçula: seu nome? EMPÓRIO DO CAFÉ LITERÁRIO. Por ser o caçula deveria estar nas fraldas e mamadeira em punho. Mas não! Ele já caminha com as próprias pernas, é falante, ousado, criativo e muito comunicativo. Posto que já fez mais de 30 amigos. Até madrinha ele tem. Aliás, ele e eu devemos muito a esta madrinha que é fada madrinha; porque dias depois de seu nascimento eu ( a mãe desnaturada), abdiquei do rebento e o coloquei fora de casa, deletando-o de minha vida. Mas como a vida acha um meio quando quer sobreviver, ele foi resgatado pela madrinha Rosemari e agora é esse jovem feliz que prima pela cultura.

Dedico esse texto a meus amigos blogueiros. Texto esse que é fragmento de uma história que deve (ainda) preencher muitas páginas.

By Lu Cavichioli

Projeto Poesia Sentir - Abr/09 - E.M."J. T. Souza"-(P.Alegre MG)

Aves

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

A escada

Todos os dias eram vazios para Reustafá. Não porque fossem de todo ruins, um desprazer. Mas a impecável rotina dos dias de sempre, assim os tornavam para ele. Era como se o dia fosse republicações da mesma notícia com variações mínimas apenas nos termos. Uma repetição automática e pantomímica. Os “bom dias”, os “olás”; as mesmas calçadas por onde caminhava, os semáforos, as pessoas estacionadas nas mesmas esquinas e as que rapidamente avançavam em direção ao consumo das horas.

Reustafá gostava de ir na hora do almoço, até o parque central que ficava próximo ao seu trabalho e lá fazer a sua refeição. Sentava-se no banco diante do lago ladeado por dois pés de crisântemo campestre a lhe fazer camuflada companhia.

Do bornéu inseparável, tirava um tapewear médio onde estava sua aveia; do menor, o yogurt duro. Bastava-lhe. O que queria mesmo era admirar as uniformes crispas da superfície do lago a movimentarem-se ordeiramente como se estivessem atendendo a um invisível chamado. Isso o acalmava e lhe dava confiança.

Após o trabalho, voltava para casa sempre pela rua Voltaire. Uma rua muito arborizada e tranqüila. Essa rua desembocava em uma bifurcação: de um lado uma praça de pequena dimensão e do outro a rua do Portal. Do lado da praça, um pequeno boulevard conduzia até uma longa e larga escadaria margeada por um bem cuidado jardim. Reustafá contou 30 degraus. A sensação era que parecia ter mais de 1000. Nunca os escalou. Sempre que por ali passava propositadamente, parava diante da escadaria e admirava sua estranha imponência harmoniosa.

Olhando para cima divisava um banco de madeira com ripas horizontais todo branco e solitário na maioria das vezes. Sentia uma enorme vontade de subir a escadaria e sentar-se àquele banco. Mas um sentimento de inexplicável constrangimento, detinha-o.

Observar o banco alaranjar-se ao poente era uma experiência indefinível por palavras. Isso o embevecia. Em algumas oportunidades, essa cena era valorizada ainda mais pelo som distante de um oboé executando uma música que identificava como sendo Bnei Heichala.
Bnei... Bnei... ecoava em sua interioridade apaziguada do mundo que lhe era tão distante.
Um grupo de crianças em gritaria passou correndo por ele e o trouxe de volta a realidade — ou tirou-lhe dela.

Morava a poucas quadras dali. Sua casa era estilo grega toda branca e abobadada. Rotineiramente ao chegar em casa tomava um banho morno; vestia uma roupa de linho leve e preparava mais um prato de aveia com pão preto. Isso lhe supria satisfatoriamente. Sentava-se na varanda com piso de tábuas de madeira com uma xícara de chá de sálvia e aquietando mente e coração, ouvia ao longe o misterioso som do oboé a melodiar em ondas irresistíveis por oceanos da imaginação.

Era feriado nacional. O bairro estava vazio. Era como se quase todos os moradores tivessem saído para viajar. Sem ter para onde ir a não ser para onde seus enfastiados sentimentos o conduzisse, Reustafá pôs-se a caminhar pelas vielas do bairro até instintivamente se deparar com a escadaria. Diante dela conduziu o olhar até o banco... lá no topo. Eram 17h40 e o céu como que em oração, convidou os mais belos matizes a formarem gradientes em mesclas intangíveis entre o dourado e o préter do mais sutil violeta... comungando com seu mais solitário observador ausente de sua própria solidão. Bnei... Bnei... a melodia a soar e sua alma gigante mal cabia em seu frágil corpo.

Sem dar conta de si, lentamente deu o primeiro passo, e o segundo, e o terceiro... até parar no décimo terceiro bem diante da residência onde morava o doce som do oboé.

Como uma reverência, a melodia saiu a cumprimentá-lo como que incentivando-o a continuar a subida. E assim o fez.
Nunca olhou para trás. Seus passos grudavam nos degraus como se tivessem ímãs. Era como se fossem os degraus a puxar seus pés a dar os próximos passos.

Uma brisa suave e cálida tal qual par de mãos, puxava-o com ânimo; uma silenciosa revoada de pássaros cruzando em diagonal sua escalada, respeitou as frases do oboé.

Sem cansaço chegou ao topo. Instintivamente contou trinta e três degraus e mais um em fase terminal de construção. Olhou à sua direita e lá estava o banco alvo a reluzir a esplendorosa cromática do poente solar. Caminhou e nele sentou-se. À sua frente descortinou-se um vasto oceano dourado; um horizonte tão retilíneo quanto seus pensamentos. Tudo que observava poderia ser descrito. Somente a paz que sentia era indescritível.
Um sorriso de Monalisa tomou conta de seu semblante.

A noite avançava e com ela o fim do feriado. Os moradores do bairro retornavam e com eles a algazarra de suas viagens preenchiam de “nada” as vielas ziguezaguiantes.

De manhã cedo um grupo de funcionários encarregados da faxina local, depararam-se com um corpo enregelado sentado no alvo banco segurando em suas mãos um oboé.

— Pobre Reustafá... era um músico tão talentoso que desperdiçou sua vida na tristeza de sua solidão — comentavam os funcionários. O que será que veio fazer aqui, sentado a noite toda diante desse terreno baldio?

terça-feira, 8 de setembro de 2009

O menino e o sol.

Renato morava em uma região quente, constantemente banhada pelo sol. A chuva era parca mas o céu não economizava a dar o ar quente de sua graça em um azul profundo.
Tinha 7 anos de idade e uma idéia no mínimo curiosa: o sol, na verdade, é uma luz que passa através de um buraco no céu.

Vivia repetindo isso aos seus colegas e amigos na mais pura ingenuidade. Claro que muitos risos seguidos de muita pecha o tornavam alvo fácil do descaso geral. Mas isso não abalava aquele coraçãozinho cheio de sonhos estranhos.

O tempo foi passando e Renato dos 7 pulou para os 14 anos repleto do vigor por questionamentos não muito condizentes com sua idade. Com o rosto cheio de espinhas, mergulhava avidamente nos livros de aventuras de pesquisadores, ficção e realidades fantásticas. Enquanto isso lá fora, seus colegas chutavam bola, quebravam vidraças e mandavam recadinhos para as meninas.

Quando na aula de ciências a professora pediu uma redação de tema livre... ah, advinha o que Renato escreveu? Quando chegou sua vez de expor o seu trabalho, notou-se uma evolução de sua teoria. Estava mais elaborada. Dizia que na verdade o sol era uma luz que havia por detrás do que chamamos céu, dentro de nosso campo visual. E que esse céu azul era como uma extensa camada de gases nobres que escondia, como um biombo, um outro céu, só que nesse não havia a cor azul ou nenhuma outra cor mas, somente luz.
A professora achou o texto muito imaginativo e bem escrito porém carente de embasamento científico e mesmo plausível de comprovação lógica. Mas Renato continuava inabalável em suas convicções.

Salto no tempo e lá está Renato na universidade cursando filosofia, especializando-se em metafísica. Sempre dedicado aos estudos, a não ser pelo fato de trabalhar exaustivamente no desenvolvimento de sua insólita pesquisa que causava desconfiança nos meios acadêmicos, era tido como um aluno de grande capacidade.

Chegado o momento de defender sua tese extraordinária, Renato trabalhou 20 horas direto para deixar tudo como idealizou.
Uma platéia dispersa e inquieta aguardava a sua apresentação.
Renato subiu ao palco como último expositor acadêmico. Irradiava uma força de convicção a qual ninguém escapou de seu contágio. Silêncio na platéia. Renato falava. Não. Mais do que a fala, Renato tocava a cada um com encadeamento lógico irretorquível.

Embasbacados, os presentes àquele marcante acontecimento, hipnotizados pela verve que fluía como água da fonte através da boca daquele homem que parecia por fim às limitações da lógica humana, sentiam dentro de si que algo extraordinário aconteceria a qualquer instante.
E aconteceu. Renato após proferir a última palavra, caiu. Caiu como se cai um tronco após decepado. O que o decepou ? Sua exaustão fruto de uma obsessiva busca por algo que somente ele sabia com tanta certeza ? Fraqueza ? Não importa o motivo, o fato é que rapidamente o levaram para a enfermaria e lá tentaram reanimá-lo, sem sucesso.

Correria total. Colocaram-no no carro do diretor e voaram depressa para o hospital. Resultado: UTI. Seu coração inspirava cuidados extremos.
Certa noite, o médico de plantão ao visitá-lo, o encontrou acordado.

Aproximou-se e lhe dirigiu algumas palavras:

— Olha só quem está de volta! E aí meu amigo, tudo bem?

Renato o olhava direto nos olhos de maneira intensa e profunda. Seu rosto irradiava serenidade.
O médico percebeu sua feição e se aproximou para auscultar-lhe o coração com o estetoscópio. Não conseguiu encostar o aparelho no peito de Renato. Um calor anormal subia até o rosto do médico que num ato reflexo se afastou tentando disfarçar o ocorrido.
Renato sensível e perspicaz como era, olhando firme para o médico disse-lhe:

— Dr. Por favor, se aproxime.

O médico se aproximou de Renato. Sentia ainda a forte radiação de calor.

— Encoste sua mão no meu coração.
Constrangido ao ouvir o que lhe disse, o médico esforçando-se por manter uma aparência de controle, vagarosamente encostou a mão no coração de Renato.

O extraordinário acontece. Ao tocar no ponto cardíaco, o forte calor passou para uma sensação de extremo relaxamento. Uma paz imensa envolveu o ambiente. O médico como quem acabou de levar um choque rápido, tirou a mão de forma ágil e abrupta do peito de Renato. Suava em bicas. As mãos tremiam. Tudo isso fruto de única reação: medo. Medo intenso lhe corria pelas vértebras. Acabara de ter naquele instante um flash visionário.

Saiu às pressas do quarto e em passos rápidos dirigiu-se para a ala reservada ao descanso dos médicos.
Estava ofegante. Pensou em tomar um calmante. Mas um sentimento estranho à sua profissão o impediu de fazê-lo. Sentou-se e tentou colocar os pensamentos em ordem. De formação rigidamente científica, sua mente cartesiana dificilmente encontraria resposta satisfatória e lógica para o que havia acabado de vivenciar.


Passaram-se 6 dias e Renato teve alta. Emagrecera 5 quilos. Seus pais o levaram para casa. Cuidaram e mimaram o filho como todos os bons pais fazem mesmo que os filhos possam ter 60 anos. Arrumaram com alegria o antigo quarto que lhe pertencera antes de se mudar para o apartamento que dividia com mais dois amigos de faculdade. Sua personalidade por demais fora dos padrões burgueses, acabou por determinar que deixasse os amigos e fosse morar sozinho. Isso para Renato foi um bálsamo. Podia dessa forma, se dedicar ao máximo à suas pesquisas metafísicas.

A janela do seu quarto dava para um pequeno pomar que seu pai, um apaixonado pela natureza, gostava de cultivar. Dali se via o pessegueiro com seus ramos de coloração marrom, indicativo do avançado do tempo que aquela árvore tinha alcançado, que próximo ao quarto, espargia seu fragor envolvente por todo o ambiente.

Renato passava longo tempo à janela a admirar o cuidado e carinho com que seu pai se dedicava às árvores e jardim de sua casa.
Divagava em seus pensamentos ao sabor de uma gostosa brisa que anunciava o fim de tarde quando teve um insight:
Uma ilusão é como uma semente: você planta e ela pode germinar e dar frutos ilusórios. Sua fome por realidade nunca será saciada. Não cuide de uma ilusão como se fosse nutrir sua alma.

A campainha da casa tocou. Seu pai atendeu.

— Filho! É para você.

Para mim? Quem será? — pensou. Era o médico plantonista que o atendera na UTI querendo saber notícias de sua recuperação.
Renato pressentiu que aquela visita inesperada era mais do que uma simples visita de médico. Pensava: como esse médico descobriu meu endereço?

— Esse é o Dr. Ramires. Veio especialmente saber de seu estado de saúde — Disse meu pai ingenuamente.

Dr. Ramires se aproximou olhando firme para Renato.
Os dois apertaram as mãos sem desviar os olhos.

— O Sr. aceita um cafezinho? Perguntou o pai.
— Sim obrigado.
— Sente-se. O que o trás aqui Dr.? — dispara Renato, sem rodeios.
— Olhe, está fresquinho. Aqui tem açúcar e adoçante. Fique à vontade, Dr. — Interrompe a mãe toda orgulhosa por uma visita ilustre.
— O que aconteceu naquela sala de UTI? Devolve de forma direta o médico.
— Descreva-me o Sr. — rebate Renato.

O médico levanta em silêncio, dá uns passos pelo quarto com as mãos cruzadas para trás como se estivesse algemado. Pensa na melhor forma de expressar o que havia experienciado naquele hospital.

— Não conseguiria descrever o que vivenciei naquele momento. Mesmo se tenta-se, o máximo que me viria à mente seria como estar em um imenso vácuo onde só luz era o que predominava. O que você fez? Você possui algum dom especial? Algum poder extraordinário de fazer com que as pessoas entrem nessa espécie de transe...

— Espere aí Dr. — Interrompe Renato, impedindo o médico de dar um rumo à conversa que já ia se distanciando do que realmente importava — Eu não sou nenhum hipnotizador, não tenho nenhum desses poderes que a mim você apregoa; também não desenvolvo nenhum tipo de prática, posturas, imposição de mãos ou seja mais o que você possa pensar. Está longe disso. O que posso lhe assegurar, e isso não tenho como provar-lhe segundo um racionalismo pragmático e científico, é que tudo o que você ”viu” possui uma base de realidade tão sólida quanto é o chão que agora nos apoiamos. Apenas sei porque algo em mim sabe.

— Diga-me. O que “vi” é externo ou tudo se passou no meu âmbito interno? Quero dizer: estive realmente em algum lugar determinável no tempo e espaço?

Nesse momento Renato não se conteve e soltou uma sonora gargalhada como a muito tempo não fazia.

— Do quê está rindo — pergunta o médico surpreso com a reação de Renato.
— Desculpe-me Dr.. Foi espontâneo. Minha franqueza pede que lhe diga o quanto soou hilário vê-lo se debater nesse cipoal mental. Seu racional castiga-o sem piedade. Aliás a todos nós.

Preste bem a atenção ao que vou lhe dizer. Para isso, desligue esse seu arsenal defensivo de conceitos e prepare-se para ouvir algo que para qualquer ser humano vazio de aspirações que não seja a sua auto-satisfação, soará como a mais pura besteira fantasiosa que alguém poderia imaginar.

Vou lhe fazer uma pergunta. E você não faz idéia como é simples a pergunta que vou lhe fazer.

— Sim. Faça-a. Você me envolveu nessa situação. Agora cabe a você esclarecer-me tudo isso que vem me inquietando.

Diga-me então. Qual é o seu nome? — Pergunta Renato com o semblante sério.

— Você está brincando! — diz o médico já se levantando.
— Você não entendeu, Retire seu nome. Aquele que ao nascer lhe deram. Esse nome na verdade, corrompe o prelado de uma consciência impessoal que sufocada pela imperiosidade do individualismo, se auto hipnotiza crendo ser o que o nome cívico lhe sedimentou como sendo um persona produto acabado. A inexistência dele revelaria um movimento ininterrupto, flutuações de sentimentos e pensamentos como nuvens que circulam em um espaço que nem ao menos um “você” pode ter absoluta certeza se é interno.
— Desculpe-me mas análise psicológica não é minha especialidade. Não sei aonde quer chegar.
— Olhe, o que eu quero lhe dizer é que o que você vivenciou não tem denominação que o defina. Está além daquele amontoado intelectulóide seja ele organizado ou não. Quando isso acontece, e é numa fração de poucos segundos, é tão intenso que obnubila totalmente a consciência hodierna, sistemática. Mesmo assim sobrepõem-se uma consciência que não se auto-afirma “eu sou” e nem a preocupação em decretar nomenclaturas a qualquer coisa. Simplesmente ela é. E isso é um sol.

Nesse momento o médico levantou-se estendeu-lhe a mão, cumprimentou-o e foi-se embora.
Lá fora o sol baixava no horizonte e o céu era o mais puro gradiente âmbar.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

Do outro lado da ponte


foto/imageshack

Mestre Noé vivia me convidando pra conhecer o mangue. Eu era moleque travesso, cabeça cheia de fantasia, mas as panela lá de casa andava vazia. Minha mãe, coitada, sofria de dor nas junta como ela mesma dizia praquela vizinhança. Sorte que Dª Ricardina dava uma mãozinha pra nóis. De vez em quando levava um pouco de feijão e farinha, uma garrafa de leite e alguns pedaço de pão amanhecido.

A mãe fazia uns trabaio de bordadeira e de vez em quando, as madame rica pedia pra ela fazer bolo de festa mais docinho. Mas demorava tanto pra pedir que a comida acabava e o dinheiro tumbem.

Meu pai, homem forte, trabalhador, tinhoso como o quê, andava viajando pras banda do Seringal. Era caixero viajante, e disse pra minha mãe que ia vortá com a mala cheia de dinheiro e ia tirar nóis tudo da miséria. Isso já tinha mais ou menos 4 anos.

Coitada da véia, ficou a olhá pro horizonte, vê se ainda conseguia enxergá, na miragem do sol, o chapéu do meu pai. Aquele maldito desgraçado! Deve de tê arrumado outra famía e esquecido de nóis.

Ficamos eu mais minha mãe e minha irmã, a Luizinha. Moça esbelta , morena da roça, perna roliça e seio farto. Em todos seus 20 anos, Luizinha nunca tinha namorado. Mas a bicha tava de zóio cumprido num peão que fazia uns servicinho pra Dª Ricardina. Mas a bem da verdade ele espichava o zóio pra ela tumbem. ARA! Nem vem, ninguém bota a mão na mana.

Um belo dia, desses de sol varando a cachola da gente, veio mestre Noé e disse pra minha mãe que tinha me arranjado trabaio, e dos bom.
- Se achegue home - disse a mãe.

Dia dona Nice!
Dia ... O traste do moleque tá se escondendo. Vem cá seu peste.

Corri e me joguei debaixo da cama. Minha mãe que já conhecia minhas fuzarca logo me puxou pelo pé dizendo:
- sai seu muleque duma figa. Mestre Nóe tá lá fora. Vai te levá pro trabaio.
_Que trabaio mãe? Eu quero ajudá a senhora na roça mais a Luizinha.
Que nada, seu tre lê lê.

Nisso eu olhei pras berada da porta e vi as bota suja de lama do mestre. Me arrepiei até a carapinha. Jesus toma conta eu disse assim, por dentro de mim.

Dia seu muleque! Fica em pé logo que tu já tem tamanho de home e braço de estivadô e mão de escavadô. Teu lombo é surrado e é hoje que tu vai comigo pro mangue.

Diacho de mangue nada Mestre. As muié dessa casa necessita de mim. Sou o único home que elas tem.

Por isso mesmo Antoninho. De hoje em diante tu vai ganhar o sustento e ajudá nas despesa da casa. Onde já se viu um home desse tamanho, fica debaixo da cama com medo do batente. ARA SÔ!

E assim, o dia, e a semana (talvez a vida) teria seu recomeço pro Antoninho, menino de seus 15 anos, 1.80 de altura , cara de bonachão e corpo de homenzarrão.

Por Lu Cavichioli

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

O natal do diabo

A festa prometia. Leroy decorou o caminho com a tranqüilidade de seus espertos 9 anos. Roupa nova e cheirando a perfume de gente grande. Seu pai não vai mesmo se importar apesar da bronca passageira quando descobrir. Afinal, foram apenas algumas gotas. Seu cabelo negro bem penteado ou melhor, bem despenteado segundo o ditame da moda.


Na mão esquerda, o presente profissionalmente empacotado com laço artístico de cetim no tom azul profundo.

O caminho escolhido foi o da vereda de ciprestes. E lá vai Leroy sozinho escoltado pela aura de inocência e pureza de intenção.

À meio caminho, pressentiu uma sombra a um braçinho de distância. Olhou repentinamente para o lado e viu um senhor alto de olhar meigo e feliz.

— Olá meu jovem amiguinho. Está indo para a festa de Natal?

— Sim. Como o Sr. sabe?

— Eu sei de muita coisa. Sei por exemplo que dentro desse presente que você carrega, está um Tan.

— É verdade. Que esperteza a sua seu moço! Como é seu nome mesmo?

— Tenho vários nomes para cada ocasião. Hoje como é uma dessas ocasiões especiais, pode me chamar de Estumersun.

— Que nome esquisito. O que significa?

— Venerável da aurora é o que significa.

— Para quê tanto nome? Não basta ter apenas um?

— Sabe amiguinho, esse é um problema que carrego por muito, muito tempo. Não posso ter apenas um nome como todo mundo. Meu nome se alterna constantemente.

— Por que?

— Porque tudo se alterna constantemente: as pessoas, os sentimentos das pessoas, os animais, as marés, os dias, as noites, as árvores... e até mesmo você meu amiguinho, está fadado à essa inevitável alternância. E em cada mudança que ocorre eu mudo meu nome para tentar escapar das mudanças constantes, entende?

— Não sei se entendi.

— Por que disse que hoje é uma ocasião especial? Você também vai à festa?

— Hou, hou, hou... é o que eu pretendo meu amiguinho. Mas não tenho um Tan para levar.

— Vamos comigo. Eu tenho esse aqui. Assim poderemos entrar juntos. Eu digo que você é meu tio.

— Amiguinho... é feio mentir.

— Amigão, pior é só mentir... he, he...

— Sabe amiguinho, você não precisaria levar um Tan. Você É um Tan.

O vento valsou com as folhas artisticamente enferrujadas envolvendo os dois caminhantes lado a lado.

— O que você fez pra não ter um Tan?

— Amiguinho, eu já tive um Tan. O mais glorioso que se possa imaginar. Seu brilho e poder são completamente desconhecidos de qualquer um neste nefasto. Não há referência possível que o torne compreensível. Quando tornei-me completo enamorei-me do fulgor e o fulgor abrasou-me com tal intensidade

que uma explosão silenciosa ofereceu-me uma escolha. E escolhi. Minha escolha criou mundos; deflagrou astúcia; plantou a progenitora da felicidade humana: a ignorância. Ah, como me regozijo vendo a felicidade das pessoas cintilar como vaga-lumes emitindo atração luciferina tal qual cupinzeiros luminescentes. Diriam ao observá-los: “eis uma autêntica árvore de Natal”.

— Como irá fazer para ter de novo um Tan?

— Não farei. Você fará.

— Como?

Estumersun estendeu-lhe a mão direita e disse-lhe: “Entregando-me”.

— Mas você é meu convidado. E aos convidados toda as honras lhe são granjeadas. É um princípio guiador de tudo quanto existe e do universo inteiro. Pelo "tan" há verdade, e sabedoria, e harmonia e...

— Não me fale assim!!! Eu sou o Venerável Celeste da Aurora! Sou o que antecede a luz matutina. Sem mim o mundo seria apenas um depósito de corpos putrefatos.

— Está bem, está bem amigão. Tome aqui o Tan. Não quero vê-lo triste.

Estumersun estendeu a mão ao encontro daquelas pequeninas mãos.

O Tan lhe foi concedido. Estumersun parado olhava orgulhoso para o Tan sentindo-se com o máximo de poder que um inefável poderia sonhar.

Mas o que Estumersun queria apoderar-se, dele apoderou-se.

Suas roupas aumentaram de tamanho. Seu calçado tornou-se demasiado espaçoso. Sua voz perdeu o timbre dos controlados. E o que mais temia aconteceu. Estumersun agora era uma criança.

— Vamos amiguinho. A Festa nos espera.

Leroy o pegou pela mão e às portas do salão, adentraram.

Um vasto salão. Plenamente iluminado. O que mais impressionava era o seu minimalismo decorativo. Nunca havia pisado em um recinto tão magnificamente limpo.

— Por que ele está vazio? — Perguntou a voz de Estumersun carregada de magia infantil.

— Porque é no vazio que a plenitude se manifesta.

Assim, correram felizes para o centro do salão e uma luz intensa os consumiu.

Não havia mais Estumersun, não havia mais Leroy. Apenas o único Natal.

11 de setembro





11 de setembro
( por Rosemari)

Naquela manhã acordou reflexiva. Fitou o espelho e aventurou - se em uma exploração facial. Descobriu uma fisionomia diferente, um semblante que a motivava a enfrentar o dia de céu azul e ensolarado.
Uma aventura especular, leve sorriso nos lábios, ao mesmo tempo em que ganhavam um colorido vermelho carmim. Acor do batom que escolhera caia muito bem com o vestido que usava, onde o decote emoldurava seu belo colo.
Embora pensativa, estava radiante diante das novas possibilidades que figuravam no cenário de sua vida. Mudanças rápidas e positivas estavam prestes a ocorrer que a deixavam segura e esperançosa.
Agenda lotada. Era preciso se apressar. Rompe seus pensamentos e deixa de lado sua aventura matinal. Apressadamente pega as chaves do carro e dirigi-se para a garagem. Na porta do elevador encontra um homem muito elegante, que a cumprimenta de uma forma sutilmente sedutora. Seu dia fica ainda melhor.
O dia ainda promete grandes surpresas. A primeira delas chega ao exato segundo em que liga o rádio, sintonizando a principal manchete. A notícia ressoa estrondosa. Acelera. É preciso saber urgente o que de fato está acontecendo. Ao chegar ao escritório, assiste pela televisão aquelas imagens horríveis que ficarão impregnadas em sua mente e no seu coração.
O Word Trade Center incendiava.
O fogo também queimava seus sonhos. As chamas carbonizavam corpos e consumavam esperanças, ideais e projetos de vida.
Faltavam apenas dez dias para seu embarque. Na agenda, o dia 11 de setembro estava relacionado a passagens, vôo para os EUA, reserva de hotel e a pauta para uma reunião com os executivos do 56º andar, em uma das torres gêmeas.
Estava tudo acertado para seu ingresso na empresa americana que a levaria a realizar seu projeto na área profissional e que há muito tempo estava sendo desenvolvido.
As labaredas envadiram sua alma, colocaram fim aos seus sonhos.
Passado e presente se misturavam àquelas chamas de fogo projetadas na tela do televisor.
As lembranças de sua última viagem à New York, onde fez o primeiro contato havia sido paradisíaca. Além de expor seu projeto, pode andar por aquelas ruas maravilhosas imaginando como seria viver fora de seu país, ao mesmo tempo em que concretizaria o sonho de brilhar profissionalmente.
Tudo estava consumado. Mais uma vez a vida lhe trouxe a realidade da dor.
Hoje, no lugar das torres gêmeas existe uma clareira. No seu coração, ainda existe esperança.

2º lugar XXIII concurso de Contos e Crônicas _ Ponto de Vista Literatura.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Fiquem bem ao som da música

Porque amo vocês, bloguistas do meu coração...
Ouvi esta música outra vez e me deu vontade de tê-los comigo
Aqui
e
Agora!

My Sweet Lord
http://www.youtube.com/watch?v=_aa3ylmxnLM

Bem haja!

Ouçam o meu coração a bater...
PUM PUM
PUM PUM
PUM PUM...

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Virtus

Um homem, juntando todo o ouro que possuía, o enterrou longe dos olhos das pessoas com a firme intenção de não só escondê-lo, mas também, sozinho, adorá-lo periodicamente. Passado algum tempo, sem ter consciência do que lhe ocorria, foi acometido por uma crise de sonambulismo. Nesse estado, andou pelos campos até chegar ao local onde havia enterrado o tesouro e desenterrando-o deixou-o à mostra. Em seguida voltou para seu quarto mergulhando em profundo sono. No dia seguinte, sem nada lembrar do ocorrido, dirigiu-se ao local onde enterrou sua preciosidade para certificar-se de que continuava bem enterrado.

Ao chegar na área demarcada, surpreso e assustado, encontrou o buraco aberto com todo seu ouro espalhado pelo campo. Então bramiu:

— Quem será que fez isso? Ou foi um animal estúpido ou algum desafortunado ignorante!

Bufando e esbravejando consigo mesmo, recolheu todo o tesouro olhando rapidamente para os lados antes que alguém aparecesse, enterrando-o em outro lugar.

Isso acontecia de forma recorrente. Cansado de presenciar tamanho desatino, resolveu montar guarda para pegar em flagrante o malfadado incógnito.

Madrugada adentro e nada de aparecer quem ou seja lá o que fosse. Cansado e pronto para voltar eis que surge a poucos metros uma silhueta humana masculina bem alta provavelmente com mais de 1,80m. De andar estranho, parecendo um autômato.

— Ora vejam só... é um sonâmbulo, só pode ser! Então é isso! Não sabia que havia sonâmbulos por aqui. Mas espere... o que ele está fazendo?

O insone visitante carregando uma caixa, parou próximo ao local onde sem o saber, estava enterrado o tesouro do observador. Agachou-se, cavou fundo e colocando a caixa que trazia, trocava-a pela que enterrada estava; retirava o ouro nela contido espalhando-o aleatoriamente pelo terreno.

Após esperar o afastamento do sonâmbulo, correu até o local e desenterrou sofregamente a caixa. Era exatamente igual a que utilizou para “guardar” o seu tesouro. A não ser pelo seu conteúdo. Ou seja, nada! Absolutamente nada havia dentro da caixa.

— Esse sujeito tem tanto de maluquice quanto de ousadia!

Resolveu segui-lo para descobrir o que o estranho fazia com o seu tesouro.
Descobriu então que o indesejado visitante, colecionava CAIXAS VAZIAS; milhares delas. Não tinha nenhum interesse no ouro ou em qualquer outro objeto que nela estivesse contido.
Apenas o vazio das caixas tinha para ele mais valor do que qualquer quantidade de ouro.

Intrigado com esse fato, resolveu procurar o insólito colecionador.
Bateu à porta da casa e uma senhora de baixo de seus 85 anos atendeu de forma simpática.
Ele então, meio sem jeito, explicou-se ou tentou, e disse que gostaria de falar com o colecionador.

A senhora simpaticíssima, lhe disse:

— Meu querido, moro aqui há mais de 50 anos sozinha. Sou viúva há vinte anos. E não tenho filhos. Sinto lhe dizer mas acho que o Sr. se enganou de casa.

Sem graça saiu despedindo-se da Sra.
Chegou em casa foi direto para o chuveiro. Era o que estava precisando.

Lá fora, no quintal de sua casa, seus dois cachorros disputavam brincalhonamente, pedaços de várias caixas vazias espalhadas pelo terreno.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

O filme vai começar

A memória ausente levou consigo o quinhão das sólidas referências de consciência que compõe a celebração à perspectiva, claro que não uma mera perspectiva, mas um ponto de fuga do ordinário; do fugaz; padronização. Isso tudo estava desativado.

Um anfiteatro para projeção cinematográfica foi o que restou à sua frente. Tão desativado quanto sua memória. Poltronas empoeiradas recobertas com lençóis amarelados; andorinhas revoavam crisnando em defesa de seus ninhos; frestas permitiam luminosos raios bíblicos; o cheiro predominante era de nostalgia.

Parado ali no corredor, olhava o vazio ambiente como quem olha para um vale do alto de uma cadeia de montanhas. A tela branca apresentava manchas esparsas. Caminhou em direção às poltronas dianteiras. Escolheu a ermo a terceira poltrona da oitava fileira; sentou-se, ou, deixou o corpo cair no estofado encaroçado e sujo levantando um ballet de poeira preguiçosa.

Fixou os olhos na tela como quem espera o apagar das luzes mas o que se apagou lentamente foi sua atenção de vigília. Um sono pesado e bem vindo o carregou dali para um sonho vívido; desses que não parecem sonhos, de tão real. Diante de sua tela mental ou seja o que for, desenrolou-se uma cena típica de uma época medieval. Uma taverna de aspecto abandonado à beira de uma estrada enlameada às cinco horas da tarde.

Aproximou-se à porta como se fosse um freqüentador regular e já ia empurrando-a; hesitou e lentamente a abriu. Ninguém presente. Encostou a mão na porta e sentiu o ambiente antes de adentrar. No recinto em penumbra divisou oito mesas muito rústicas cobertas com panos velhos e sujos. Somente uma delas estava em melhor condição. Estava limpa com pratos e talheres postos. Havia uma talha e uma caneca de argila verde. Supôs que na talha deveria haver vinho.
Sentou-se. Apanhou a talha e sentiu o peso do líquido. Não hesitou em encher a caneca. Sim, um vinho, densamente tinto.

Bebericou bem devagar para sentir o aroma e o frutado do mosto. O carácter do precioso, se lhe apresentou às portas do divino. Tudo ao redor lhe parecia arranjado para proporcionar bem estar.A cada gole fechava os olhos e se lhe abriam visões como de multidões em alvoroçado falatório; música rápida e instigante fustigava-lhe os ouvidos.

Degustava um gole do precioso, enquanto sentia que o local rodopiava à sua volta como se estivesse em um carrousel. De repente tudo escureceu.Só negrume o envolvia. Sentiu medo; muito medo. Pior, não sentia o chão. Silêncio total. De sobressalto faltou-lhe o ar quando um facho de luz o atingiu no peito revelando tudo que havia a sua volta. E o que viu assombrou-lhe completamente: uma platéia atenta olhava-o como quem espera uma atitude de cena. Ergueu-se sabe Deus como, e olhando para a platéia soltou: “o que vocês querem?” Logo percebeu que essa frase ecoou apenas em sua mente. O público continuava impassível.

Então entendeu que sua realidade não ultrapassava a dimensão de uma tela

— Estou preso a uma tela!... tela... cela...

Tentou pular para fora dali mas o que conseguia era um avanço apenas virtual. Percebendo a inutilidade de qualquer esforço para escapar, resignou-se.

Uma voz em off lhe disse:

— não se canse à toa apenas siga o script; distraia-os; o filme já vai começar — mais uma vez.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

Vênus

Esta é a história de Ferdinand. Milênios e milênios trabalhando como Cupido o levaram a uma estafa e como conseqüência entrou em depressão. Afastou-se do convívio com outros cupidos. Era visto vagando sozinho de asa arreada sem arco e flecha... cabisbaixo.

Um dia sentou-se no banco do jardim e ficou horas fitando a névoa. Pensava: “ Sou mesmo um estúpido Cupido; passei toda minha existência a flechar o coração de muitos casais apaixonados e o que me restou foi passar minha vida limpando arco e polindo flechas; passo meus dias sozinho e não conheci até hoje uma companheira que arrastasse uma asa pro meu lado. O que farei? Não tenho curso superior; se tivesse poderia voar mais alto. Soube que estão abertas vagas para arcanjos. O céu é o limite.
“ Já sei! Vou dar entrada com um pedido para me tornar humano. Tenho uma licença prêmio para cumprir. "

Chegando à presença de Vênus, fez a solicitação. Vênus lhe falou:

— Muito bem. Para onde queres ir?
Ingênuo como era, Ferdinand ainda escolheu o dia: 12 de junho.

— Quero surgir em meio às maiores oportunidades de ser atingido no coração; ser pego por aquilo que é o alvo de todos os seres humanos.

Num piscar de olhos o máximo que conseguiu ver foram luzes amareladas no teto do corredor de um hospital da periferia. A poucos quilômetros deixara o Morro do Céu no complexo da Lagoinha.

O tiro foi certeiro.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Tem gente no balcão...VAMOS ATENDER!!




Ai ai ai... tem gente que possui um poder de controle fora do comum. Eu digo, controle sobre os outros. Eu fico perplexa como as pessoas se deixam levar desta forma. Creio que são pessoas fracas, estas que se deixam influenciar. Agora, vamos combinar??? O poder de controlar tem que ser muito persuasivo. O dono do poder tem que ser muito bom, poderoso mesmo ahauhauhauhauhauahuahuh!! Só rindo.

Tem gente também que fala e não cumpre. Ou melhor, o que fala , não se escreve. Mas a vida é assim mesmo. O aprendizado está sempre livre pra quem quiser pegar carona com ele. Faça sinal de pare e sente no banco da frente.

Fui.
*****************************************************************************

*Esse texto foi um desabafo e se resume à minha vida real.Foi escrito em 2008 e publicado em um falecido blog.

É um texto antigo e oportuno para discussões e/ou debates. Vamos nessa, quem se habilita?

Estou trancando o Quiosque. Ninguém à vista.
Boa noite!

sábado, 8 de agosto de 2009

Quiosque dos Pais



A todos os pais do Quiosque, um domingo suave, abençoado e repleto dos abraços de seus filhos.

Aos pais que já fizeram a viagem, fica a história, a memória, o rosto, as rugas, as mãos que tanto trabalharam e afagaram e abraçaram. Fica o amor que plantaram e que as sementes ( que um dia foram) - hoje frutos e flores, brilhem e rebrilhem para sempre em todos os corações.

O Quiosque deseja a todos esses homens lutadores e amorosos. UM IMENSO ULTRA MEGA DIA DOS PAIS.

Com carinho

LU CAVICHIOLI E EQUIPE

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

O mundo tem o tamanho da minha visão.

Quando criança meu quintal era uma cidadela inexpugnável.Organizei batalhas que duraram séculos nas poucas horas que minha imaginação elástica, teve a permissão da criatividade para superá-la. Não houve mortos nem feridos. Apenas a dádiva da imortalidade em manhãs ensolaradas no pátio de minha casa, ou do meu vasto reino. O céu podia esperar sem pressa. Concedi glórias, aniquilei a soberba de invasores, desfrutei de conquistas, eternizei epopéias.

Hoje o mundo é pequeno. Muito pequeno. Não é mais um quintal.Tem o tamanho do meu quarto. Nesse quarto cabe a Europa, a Ásia, a África... todo longínquo espaço imaginável e inimaginável. Percorri os quatro cantos do mundo... e o meu quarto sempre esteve comigo; dimensionando meus sonhos, fortificando serenamente meus rituais de passagem para a realidade.Como o mundo é pequeno demais! Por mais que eu caminhe, as distâncias se encurtam, o tempo se esvai como neve ao sol.

Não sou pródigo. Apenas um filho que cansou de rejeitar a comida dos porcos e quer voltar pra casa mesmo que descalço. Meu apetite é cronofágico. Consumo a mim mesmo segundo a segundo. Ainda a pouco... ainda é pouco, ainda é tic... ainda é tac.As trilhas causam sulcos profundos na consciência. Trêmulas lembranças são gelatinas servidas em potes de aço. No regaço, no fundo da floresta que há em mim, ainda me resta uma ante-sala guardada a sete chaves; chaves essas perdidas por debaixo de alguma distraída saudade.

Como é minúsculo esse mundo! Como é maiúsculo o mistério que o interpenetra. Abraçá-lo é tarefa para gigantes. Rondas e rondas solares passam sem feriado cósmico. Sem descanso a roda gira e eu a observo sem ser seu servo.Olho para o campo de batalha que ficou para trás e meus olhos pesam como chumbo.O chumbo do sono; do sono que me faz sonhar; do sonho que me torna lúcido ao despertar.

Oi, Claro que estou Vivo!

Tenho tido bem pouco tempo pra postar, ler blogs, comentar e todas essas coisas. Razão pela qual a comunicação virtual via blogs tem sindo lamentavelmente mal atendida.

Nos próximos chás de sumiço (já previsíveis), nada que ver com nem esquecimento nem negligência. É só que ando trabalhando demais. Tempo livre pra mim anda assim curtinho feito coice de porco. Mas quanto a isso já me expliquei e justifiquei tanto aqui como alhures, agora chega. Vamos ao episódio que hoje vim contar.

Pessoa muito próxima e querida minha comprou um aparelho novo para a filha de 14 aninhos que tivera seu celular roubado, depois de tomadas todas as demais providências aconselháveis para o caso.

De minha parte, ando pra lá de escaldado com os tantos desserviços que as operadoras prestam hoje em dia. Não é à toa que os processos contra elas se avolumam cada vez mais por todos os forums da vida.

Entretanto, a referida operação transcorreu dentro da maior normalidade desse mundo, e resultou perfeitamente satisfatória. Na barganha, um chip contendo uma boa franquia veio de brinde. Isso tá na cara que não passa de um golpe de mestre que eles dão visando criar demanda. Tudo é cientificamente calculado. No fim das contas, eles auferem lucros astronômicos com a jogada. Mas cá entre nós, ganhar créditos telefônicos é bom, também.

A operadora é, coincidentemente, a mesma do meu celular. A referida pessoa resolveu então dar pra mim.

Era irrecusável. Sem relutância, aceitei. Agora, por um bom tempo, não haverá qualquer motivo para não nos falarmos bem à vontade mesmo que meu telefone fique "pai-de-santo" (só recebendo). Basta eu usar o tal chip. e estamos conversados. Assunto é o que não falta. Serve até gentilmente cedido pelo impagável Stevie Wonder: "I just called..."

Uma menina é roubada mas nada sofre além do susto e da perda de seus pertences. Como adolescente não vive sem telefone, ganha outro e até eu acabo beneficiado. É happy end pra ninguém botar defeito, né?

- Alô! ... Hello! ... Mushi Mushi! ...

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Caderninho mágico: Uma festa gramatical



Papel comum
linhas e margens
espaços em branco
hospedeiro das letras
colecionador de palavras
folhas avulsas
perdidas, desorientadas
Fonemas e encontros consonantais
harmônicos, conversam sobre cada linha.
Figuras de sintaxe se exibem no espelho das frases.
Os vícios de linguagem mancham as paredes do texto, enquanto o apóstrofo e o hífen fumam um cigarrinho na varanda da próxima página.
Do lado de fora, os numerais, querendo invadir a festa.

O abecedário em discurso:
a arte pela arte
a mão e a caneta
Dentro da pasta
o caderno
dentro do caderno
a magia
nas folhas, o bordado
de tom acentuado
elas:
AS PALAVRAS

Por Lu Cavichioli

domingo, 2 de agosto de 2009

Poupança de memórias

Existe uma mercadologia psicológica insuspeitada, tramitando nas bolsas de nossos valores pessoais. Por esse ângulo, pede-se uma postura de investimentos diante da vida; que se faça uma poupança de todas as nossas lembranças. Desde as quais nos lembramos com prazer até as que temos desprazer em lembrar. No final das contas não somos poupados com o que fomos, mas, com o quê somos.

Logo cedo começamos a poupar umas memórias aqui, umas pequenas lembranças ali e o nosso pé de meia mnemônico vai se avolumando. Tempos difíceis podem estar por vir. E nesses momentos podemos lançar mão de nossos proventos de recordações para saldar algumas dívidas e dúvidas acumuladas pela vida. Descobrimo-nos economistas a traçar planos de estabilidade que assegurem rentabilidade de satisfação a longo prazo.

Depois de muito poupar pensando em um final de vida “feliz e tranqüilo”, nos veremos de mãos vazias diante do que nos for imposto como irrevogavelmente imposto é. Nossa memória se vê impotente diante da virada de regra do mercado das ações e reações a que tanto estávamos acostumados perdulariamente. Fechamos para balanço e o que mais balança são nossas crenças desvalorizadas e nem ao menos servindo para troco. E pensando bem (mesmo mal também) a troco do quê, não é mesmo?

Com o cofre da consciência abarrotado de vazias lembranças, nos vemos como sempre fomos: híbridos; uma junção de fortunas sem valor e valores que desafortunadamente ninguém reconheceu.

Assim, sentados perdidos em circunspecções, rigorosamente induzidos e deduzidos, volteamos às memórias como último vintém poupado na esperança de poder adquirir “vida nas recordações”. Pagamos por um bem vitalício e o que recebemos, descontadas todas as nossas pendências, mal cobre o que deixamos pendurado: o consumismo de nós mesmos.

sábado, 1 de agosto de 2009

Intercâmbio Cultural





Amigos e colaboradores do Quiosque do Pastel, atravessem a ponte da ineração e visitem
Empório do Café Literário

Entrem, fiquem a vontade e escolham um lugarzinho bem aconchegante. Fique de olho no cardápio literário e aproveite para pedir um café de sua preferencia.

A gente se vê lá!

Meu abraço!

Lu Cavichioli

terça-feira, 28 de julho de 2009

A dura vida de um morto

Morri. E daí?E lá vou eu de novo. A história se repete mais e mais uma vez. Esse negócio de morrer já está ficando cada vez mais cansativo. O fato, é que certos padrões de acontecimentos em vida e em morte, se mantém, como se fosse a mesma partitura de uma música, só mudam os arranjos — ou desarranjos, sei lá. Será que isso não tem um meio de acabar de uma vez por todas? Quando penso nessa repetição de existências espaçadas, concluo que só pode ser reencarnação. Mas como posso ter certeza de uma afirmação dessas se não lembro de minha encarnação anterior? Mas, todas vez que eu morro, quando acho que vou viver o permanente, o eterno... pronto! Um profundo adormecimento me leva a esquecer de tudo o que se passou, e sou levado a morrer também depois que estou morto. Dá pra entender uma coisa dessas? Morro aqui e morro lá?

Observando a confusão que se estabelece em meio a corre-corres, lufa-lufas, comoções exacerbadas, burocracias desgastantes...depois de escolado por tantas idas e vindas, isso não me chateia mais. Que monotonia! A sensação é de que já nasço com a passagem de volta comprada. E ainda tenho que pagar por ela em vida. Nada é de graça mesmo.

Olhando aquele corpo estendido no chão (isso dá samba), inerte, pálido e azulado, não tenho a mínima intenção de tentar ressuscitá-lo. E pra quê? Deixa quieto. Parece uma roupa usada jogada no chão.

Tanta correria, tanta preocupação, e agora aí, duro que nem um boneco de corda (levando-se em conta que de certa forma esse era o meu estado normal quando “vivo”).

E o tal de velório então? Parece que jogaram gás lacrimogêneo no ambiente. Lamúrias, choramingos e choros compulsivos é regra de ordem do protocolo cerimonial. Ou teatral. Se eles soubessem como isso me chateia e perturba...Não sabem que não aconteceu nada? Eu só morri, gente!

Mas também morro de rir quando pego uns flagras de alguém num canto, contando piada, ou outro que não sabendo o que dizer ao parente do falecido aqui, em vez de falar “meus pêsames”, gagueja e solta um “felicidades”. Mas tudo bem, esse é o lado branco do humor negro.

O tal túnel de luz? Ah, de tanto fazer esse trajeto, durmo na viagem. Quando acordo, tô lá em meio à... como é mesmo? Ih, deu branco. Mas até onde me lembro, muita coisa já esqueci. E olha, vou dizer mais uma coisa: esse negócio de inferno e céu não é bem assim não. Está tudo aqui na nossa cabeça. Cabeça? Bem, seja lá onde for, o que eu quero dizer é que nós mesmos construímos, ou esse inferno, ou esse céu. A proporção está diretamente ligada ao grau de importância que damos a isso. E só se descobre isso depois de morto. Isso é que é ser burro, né?

Por isso que eu morro sempre e até hoje não descobri a fórmula certa. É por essas e outras que a gente tem que ser vivo. Não se deixar levar por qualquer tiri ti ti atemporal; como alguém, te metendo medo pelas coisas que você faz ou pelas que não faz. O céu e o inferno, está tudo aqui dentro, ó! Somos nós que construímos. É mais ou menos como construir a casa de seus sonhos: pode ser feliz em um barraco, ou infeliz em uma mansão.

Bem, pra quem já morreu, falei demais. Fui.Tchau, até a próxima...