No Balcão do Quiosque

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O filho do Brasil

As 24 horas do dia lhe eram totalmente estranhas. Não era muito nem era pouco. Apenas insuficiente por conta do excesso de sonhos. Lá pelas tantas acordava. Pra lá depois de tantas, dormia para esquecer o que lhe deprimia. Seu pai, seu Brasil, era um homenzarrão; um gigante pela própria natureza que Deus lhe havia emprestado para tomar de volta na hora incerta. Seu Brasil era assim um tipo que os psicólogos logo o rotulariam de dicotômico. Oscilava entre o passado naftalínico e o futuro aguardente... dentes lhe eram arejados e os olhos marejados do suor que vinha da alma indigente prescreviam-lhe invisíveis remédios que somente ele conseguiria ingerir.

A parte do corpo que mais utilizava era o cotovelo — e com que desvelo... Com ele seu Brasil perdia a vida e ganhava a morte. Não era um cotovelo qualquer. Não, não senhor. Era um cotovelo de última geração. Todo calejado com o mais resistente efeito de dormência que um cotovelo poderia ter. Os balcões da vida que o digam. Quantos deles se entregaram resignadamente diante desse peso constituído de carne ressecada e ossos porosos a lhes pressionarem a lisa e empossada superfície etílica.

Mas seu Brasil tinha a persistência da desistência. Com a mesma facilidade com que se inflamava na tola e passageira alegria, queimava-se na malandragem feita por tanta mal disfarçada tristeza.
Ninguém duvida da capacidade e dos talentos ocultos que habitam o seu Brasil. Quando bem intencionado, dele poderia se extrair muitas insuspeitas riquezas.

Seu Brasil mal sabe que carrega em si o destino que tanto pensa saber. Seu Brasil é o pai do futuro de seu filho gerado por uma impaciência atrevida tão devida mais por alienação incultivada do que por uma ignorância herdada.

Ah seu Brasil... o tempo acaba só quando termina. E mina aos poucos o pouco que ainda resta do nada que se pensou ter.
Filhos de homens como seu Brasil, são gentis com o próprio solo onde pisam por respeito ao calejado que a vida lhes impõe.

Um dia seu Brasil vai morrer. E com ele sua curta memória de uma vida tão curta de importância, que vai ficar na lembrança apenas mais um capítulo da novela que deixou de ver.

Ouvir-se-á lá ao longe num Ipiranga imaginário, que o filho daquele otário, o amou com tanta intensidade que na verdade somente o silêncio do mundo o abraçou com o penhor de uma igualdade que nem a mais próspera sociedade um dia já sonhou.

E se ao restar só e filho, o que anda carregando o próprio corpo abandonado, lá vai o bravo soldado à luta fingida igual a intenção de um germicida que longe do povão, aperfeiçoa para seu intento, da alma dos coitados, o seu quinhão.

O que se sabe de tudo isso é apenas a questão: alguém salve seu Brasil. Sua saúde pode matá-lo.

5 comentários:

chica disse...

Maravilhosa crônica,Leandro. E a saúde dele anda mal mesmo em tantos sentidos...abração,chica

Graça Lacerda disse...

Leandro, meu amigo!!!!

Que crônica!

Estou aqui lendo e relendo e se possível deixo 'queimar o arroz' rs... para ler de novo e de novo...Sério!

...uma das características fortes de 'Seu Brasil' é mesmo essa da "persistência da desistência"!!!

Vou salvá-la pra trabalhar com meus alunos, na Biblioteca da escola.
Depois te dou o retorno.

Muito boa! Parabéns. Um abraço!

Marcos Santos disse...

Leandro
Os intestinos de seu Brasil estão infestados e sobrecarregados de parasitas. Talvez um vermífugo bem forte de jeito.

Graça Lacerda disse...

...rsrsrs

estou aqui concordando em todos os gêneros com o Leandro!!!

Abraço.

Graça Lacerda disse...

ops...desculpe-me...

com você, MARCOS!!!